Mais de 14 milhões são microempreendedores individuais; quem teve renda mensal a partir de R$ 2.380 deverá pagar IRPF
Quem é autônomo ou tem um pequeno negócio formalizado como MEI (Microempreendedor Individual) tem diversos benefícios ao fazer a opção pelo Simples Nacional, com o custo de um pagamento mensal único, que inclui nove tributos. O que poucos empreendedores sabem é que o sistema de tributação simplificado cobre apenas as obrigações da empresa, o CNPJ, deixando de fora o CPF, a pessoa física, o 'empresário' dono do CNPJ.
Pode parecer confuso para alguns
profissionais, sobretudo para quem é prestador de serviços e vende a própria
força de trabalho, como qualquer trabalhador contratado pela CLT (Consolidação
das Leis do Trabalho), e na prática não tem uma empresa que dá lucro. Mesmo
assim, é preciso ter em mente que, a partir do momento em que é feita a
formalização da atividade como MEI, que garante um CNPJ e permite a emissão de
nota fiscal, é criada uma empresa, e o empreendedor assume esse papel de
empresário.
Como empresa, ele tem a obrigação
de, anualmente, enviar à Receita Federal a DASN-SIMEI (Declaração Anual do
Simples Nacional), a declaração de imposto das empresas optantes pelo sistema
simplificado de tributação. Como empresário, em alguns casos, também pode ser
necessário fazer a declaração
do IRPF (Imposto de Renda das Pessoas Físicas). O que determina essa
obrigatoriedade é a mesma lista de critérios válida para qualquer outra
pessoa.
Para aderir ao Simples, a empresa
deve ter receita bruta igual ou inferior a R$ 30 mil por mês, ou de até R$
360 mil ao ano. Todo MEI pode fazer essa opção, já que o limite estabelecido
para que a atividade profissional ou negócio seja enquadrado nessa categoria é
o rendimento mensal ser de até R$ 6.750 por mês, ou de R$ 81 mil ao ano. Se
ultrapassar esse valor, a empresa muda de status.
"O MEI tem de enviar à
Receita a DASN-SIMEI sempre até 31 de maio, mesmo se no ano-base não houve
atividade, emissão de nota e receita", diz Tiago Slavov, professor e
coordenador do NAF (Núcleo de Apoio Contábil e Fiscal) da Fecap (Fundação
Escola de Comércio Álvares Penteado).
Se a empresa estiver em dia com
o DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional), não vai pagar mais
nenhum imposto, desde que continue dentro dos critérios do Simples Nacional.
O DAS é gerado no site do Simples Nacional, e pode ser pago até o dia
20 de cada mês. A DASN-SIMEI é feita nesse mesmo sistema da Receita Federal. Na
guia de contribuição mensal, o MEI paga 5% do salário mínimo para a Previdência
Social, R$ 1 de Imposto sobre Serviços, caso o atue nesse ramo, ou R$ 5 de ICMS
(Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços), se exercer atividade no
comércio.
Segundo a Receita Federal, com
essa contribuição, o MEI recolhe nove tributos de uma só vez: o IRPJ (Imposto
sobre a Renda da Pessoa Jurídica), o IPI (Imposto sobre Produtos
Industrializados), o CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido), a Cofins
(Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), a contribuição para o
PIS/Pasep (Programa de Integração Social / Programa de Formação do Patrimônio
do Servidor Público), a CPP (Contribuição Patronal Previdenciária), o ICMS
(Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre
Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicação), e o ISS (Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza).
Sobre a DIRPF (Declaração de
Ajuste Anual do Imposto de Renda de Pessoa Física), para saber se é necessário
enviá-la à Receita Federal, os microempreendedores individuais precisam
calcular o lucro decorrente da atividade realizada ou o pró-labore recebido
como empresário, que corresponde à retirada de dinheiro feita pelo dono ou
pelos sócios do negócio.
"Por exemplo, um MEI que
trabalha no comércio, alguém que produz e vende alimentos, emitiu notas no
total de R$ 40 mil no ano, e teve R$ 10 mil de despesas (com água, luz, gás,
aluguel, telefone e internet) que precisam ser comprovadas, o lucro dele no ano
foi de R$ 30 mil", explica Slavov.
A partir desses valores, o MEI
terá que enviar a prestação de contas se:
. Teve rendimentos tributáveis
acima de R$ 28.559,70 no ano anterior;
. Recebeu mais de R$ 40 mil isentos, não tributáveis ou tributados na fonte no
ano (como indenização trabalhista ou rendimento de poupança);
. Teve ganho na venda de bens como casas e carros, entre outros;
. Teve ganhos superiores a R$ 40 mil ou ganhos líquidos cuja apuração está
sujeita à incidência do imposto em operações em bolsas de valores, de
mercadorias, de futuros e assemelhadas;
. Ganhou mais de R$ 142.798,50 em atividades rurais ou obteve prejuízo rural a
ser compensado no ano-calendário de 2022 ou nos próximos anos;
. Era proprietário de bens de mais de R$ 300 mil em 31/12/2022;
. Passou a residir no Brasil em qualquer mês do último ano, permanecendo no
país até 31 de dezembro;
. Optou pela isenção do Imposto sobre a Renda obtida com a venda de imóveis
residenciais, caso o montante seja aplicado na aquisição de outro imóvel
residencial localizado no país, no prazo de 180 dias, a partir da celebração do
contrato de venda.
O comerciante de alimentos do
exemplo dado pelo professor, que teve lucro de R$ 30 mil no ano, por ter
rendimentos acima de R$ 28.559,70, deveria fazer a DIRF, mas como esse cálculo
está incompleto, isso ainda pode mudar.
Como calcular o rendimento da
pessoa física?
"O MEI é tanto pessoa física
quanto empresário e, nessa condição, tem de somar os rendimentos obtidos como
empresa a outros rendimentos que ele possa ter recebido durante o ano. Se a
pessoa tem um emprego e realizou atividades como MEI, precisa declarar as duas
fontes", afirma Slavov, professor da Fecap.
Ele explica que o rendimento
tributável de quem atua como MEI não é o valor total do faturamento da empresa,
declarado na DASN-SIMEI, mas precisa ser calculado. Para fazer essa conta,
devem ser consideradas as despesas comprovadas relacionadas com a atividade ou
serviço prestado (aluguel, conta de luz, internet, material de trabalho, etc.),
e o percentual de isenção por categoria de atividade comercial, necessário para
a obtenção do valor do lucro presumido.
"O MEI paga imposto todos os
meses e, por isso, precisa controlar seu faturamento, saber quanto teve de
receita, quanto daquela receita é tributável e quanto não é tributável. A
legislação tributária equipara o microempreendedor individual à pequena empresa,
o que pressupõe uma estimativa de lucros. Na maioria dos casos, o MEI tem, na
verdade, rendimento e não lucro, mas perante a lei, parte desse rendimento é
vista como lucro", comenta o professor.
Portanto, se o trabalhador ou
microempresário que é MEI emitiu nota fiscal, significa que ele teve
receita e, se teve receita, pode estar isento ou não do pagamento do Imposto de
Renda. "Para as faixas de isenção, a Receita Federal considera os
percentuais sobre as receitas determinados pela legislação, que variam conforme
o tipo de atividade", diz Slavov, que completa: "a parcela isenta
pode ser de 8%, 16% ou 32%".
"No caso de atividade
comercial, é aplicado percentual de 8% sobre a receita [também para indústria e
transporte de carga]; se for uma atividade de transporte de passageiros, como a
de um motorista de aplicativo, a parcela isenta é de 16%, e para serviços em
geral, aplica-se 32%", afirma.
"O MEI do exemplo anterior,
que produz e vende alimentos, está na faixa de isenção de 8%, porque sua
atividade é no comércio. Uma parte do lucro de R$ 30 mil que ele teve no ano é
de rendimentos não tributáveis, o que é calculado pela faixa de isenção",
explica Slavov.
Dessa forma, do lucro de R$ 30
mil, R$ 2.400 são rendimentos não tributáveis, e o imposto incidirá sobre R$
27.600.
"Se a pessoa que ganhou R$
40 mil no ano fosse um prestador de serviços e também tivesse lucro de R$ 30
mil, como estaria na faixa de isenção de 32%, a parte isenta do rendimento
seria R$ 12.800, e a tributável, R$ 17.200", calcula o professor.
"Nos dois casos, se esses
microempreendedores não tiverem outras fontes de renda, estarão dispensados de
entregar a declaração da pessoa física, porque os rendimentos tributáveis
ficaram abaixo de R$ 28.559,70", completa.
Mais detalhes sobre o
enquadramento das atividades estão na Lei nº
9.249, de 26 de dezembro de 1995, que "Altera a legislação do
imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o
lucro líquido, e dá outras providências", principalmente no Artigo 15.
Para fazer o cálculo completo dos
valores a declarar no IRPF, basta seguir cinco passos:
1° passo: calcular o lucro do seu
negócio, subtraindo da receita total bruta anual as despesas feitas durante o
ano (água, luz, telefone, compra de mercadorias, aluguel de espaço, entre
outras);
2° passo: calcular a parcela
isenta, a fração da receita que não será tributada. O percentual (8%, 16% ou
32%) depende do tipo de negócio;
O valor da parcela isenta será
usado para preencher a seção “Rendimentos Isentos - Lucros e Dividendos
Recebidos pelo Titular”, na Declaração do Imposto de Renda, que pode ser feita
pelo aplicativo ou site Meu Imposto de Renda, ou pelo Programa do IRPF 2023.
4° passo: calcular o rendimento
tributável, a parcela tributável do lucro, pegando o resultado do 1°
passo (lucro) e subtraindo dele a parcela isenta (3° passo);
5° passo: verificar se esse
resultado, o valor da parcela tributável, enquadra-se no primeiro caso de
obrigatoriedade de envio da DIRPF à Receita Federal, que é ser superior a
R$ 28.559,70. Se for o caso, ele será usado na declaração e deverá ser
informado na seção “Rendimento Tributável Recebido de PJ”.
Segundo Slavov, para a declaração
de pessoa física, o MEI está sujeito às regras que valem para todo mundo.
"São vários parâmetros, mas o principal é ter rendimento tributável acima
de R$ 28.559,70. Toda pessoa física que teve rendimento acima desse valor tem
que entregar a DIRPF", fala.
O prazo para o envio das
declarações do IRPF começou na quarta-feira (15) e vai até 31 de maio.
Imposto a pagar
Diferentemente de quem trabalha com
carteira assinada, que, dependendo de quanto recebe de salário, tem Imposto de
Renda retido na fonte (descontado diretamente na folha de pagamento, pelo
empregador), o MEI pode ter que pagar Imposto de Renda na declaração como
pessoa física, já que não faz o pagamento mensal.
Atualmente, está isento do
pagamento de IR quem recebeu em 2022 até R$ 1.903,98 por mês. Para quem teve
renda acima desse valor, há uma tabela com cinco alíquotas, que são
porcentagens cobradas sobre o total recebido, e que variam de acordo com a
faixa de rendimentos dos contribuintes.
A alíquota do IR é progressiva:
quanto mais o microempreendedor lucrar acima da faixa de isenção, mais imposto
ele terá de pagar. Esse pagamento pode ser dividido em até oito parcelas.
Felizmente, o programa, site ou
aplicativo da Receita Federal por meio dos quais se faz a declaração calculam o
valor a ser pago, com base nas alíquotas de 7,5%, 15%, 22,5% e 27,5%, as mesmas
aplicadas às demais pessoas físicas. Mesmo assim, é importante conhecer as
faixas e ter uma ideia da porcentagem do IR que é pago mensal e anualmente.
Quem teve rendimentos tributáveis
de até R$ 1.903,98 por mês está isento, não precisa pagar imposto. Para quem
recebeu entre R$ 1.903,99 e R$ 2.826,65, a alíquota é de 7,5% sobre a renda
menos o valor da parcela a deduzir, de R$ 142,80. Ela é usada para o cálculo do
imposto ser proporcional a cada faixa de rendimentos.
Para as pessoas que toveram
rendimentos tributários, provenientes de salários, aluguéis, pensão, bônus, investimentos,
lucros e outros pagamentos, de R$ 2.826,66 a R$ 3.751,05, a alíquota é 15%, e a
parcela a deduzir é de R$ 354,80. A penúltima faixa da tabela é dos ganhos
entre R$ 3.751,06 e R$ 4.664,68, cuja alíquota aplicada é de 22,5%, com
valor de dedução de R$ 636,13. Para rendimentos acima de R$ 4.664,68, a
porcentagem aplicada é de 27,5%, e a parcela a deduzir é de R$ 869,36.
"Digamos que o MEI teve um
faturamento de R$ 81 mil no ano, e uma despesa de R$ 20 mil. O lucro foi,
então, de R$ 61 mil. Se ele atua no setor de serviços, a porcentagem do
rendimento isento é 32%, que dá R$ 25.920. Já o rendimento tributável dele vai
ser os R$ 61 mil menos R$ 25.920, que vai dar R$ 35.080. Esse valor é maior que
R$ 28.559, portanto, nesse caso, a declaração do IRPF é obrigatória, e é
preciso informar o rendimento tributável", exemplifica Slavov.
Com o rendimento anual superior a
R$ 35 mil, o microempreendedor vai ter de pagar Imposto de Renda. Ele entra na
terceira faixa, com alíquota de 15%, pois o rendimento mensal médio é R$ 2.923.
O cálculo para saber o valor do imposto a ser pago é baseado na fórmula
seguinte:
(salário médio mensal x
percentual de alíquota) - valor a ser deduzido
Nesse caso: (R$ 2.923 x 15%)
- R$ 354,80 => R$ 438,45 - R$ 354,80 = R$ 83,65 por mês
O imposto devido (a ser pago pelo
MEI) é de R$ 83,65 por mês, que dá R$ 1.003,8 no ano. É esse valor que deverá
ser pago à Receita Federal.
Mas, o professor da Fecap conta
que a legislação tributária prevê uma exceção, que libera o microempreendedor individual
do pagamento do IR, seja qual for seu rendimento. "Para não ter de pagar
imposto, o MEI teria de fazer contabilidade. Isso significa procurar um
contador, que vai preparar a escrituração contábil e vai cobrar para fazer
esse serviço", fala.
Isso acontece, segundo o docente,
porque a contabilidade é um processo de escrituração. "A escrituração
contábil tem valor legal, é de onde vem o cálculo do dividendo, que é o lucro
apurado pela contabilidade. O dividendo tem que ser demonstrado pela contabilidade,
eu não posso chegar pro fisco falar que tive um lucro 'de tanto', ou mostrar
uma planilha do Excel, isso não é admitido do ponto de vista fiscal",
explica Slavov.
Com a contratação de um contador,
o microempreendedor não tem de pagar IR porque o dividendo é isento.
"É uma premissa da lei, uma regra da legislação tributária brasileira do
Imposto de Renda que, inclusive, está na pauta da reforma tributária e foi uma
das promessas de campanha do presidente Lula", afirma.
Ele diz que, na prática, essa exceção
é pouco utilizada por MEIs e pequenas empresas optantes do Simples. As outras
empresas têm, obrigatoriamente, um contador, porque a contabilidade é uma
exigência legal. Para o MEI, que representa um contingente muito grande de
atividades, acaba não compensando financeiramente pagar por esse serviço.
Para o professor, o empreendedor
tem de avaliar o que compensa mais, se pagar o imposto ou o contador. "Se
o MEI tiver um rendimento muito alto, pode ser interessante procurar um
contador, que vai auxiliar nos cálculos, tirar dúvidas, e ainda trazer essa
vantagem da isenção", finaliza.
A multa pelo atraso ou por não
entregar a declaração tem valor mínimo de R$ 165,74 e valor máximo
correspondente a 20% do Imposto sobre a Renda devido, conforme consta na Instrução Normativa RFB nº 2134, de 27 de fevereiro
de 2023, no capítulo dez. A cobrança pode ser feita em até cinco anos, mesmo
prazo que devem ser guardados os comprovantes de tudo o que é declarado.
Para quem ainda tiver dúvidas
sobre a declaração do Imposto de Renda, o professor Tiago Slavov indica
a seção de Perguntas e Respostas IRPF 2023, do site da Receita
Federal, que também foi recomendada pelo supervisor regional do Imposto
de Renda no estado de São Paulo, o auditor-fiscal Ricardo Roberto Mendes
Ribeiro Junior.
Mariana Botta, do R7
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