
Sem lugar
seguro: quarentena expõe crise de violência doméstica no país
No país em que
7 a cada 10 vítimas de feminicídio são mortas dentro de casa, permanecer segura
no próprio lar é mais um desafio do isolamento
Nos plantões
diários de enfrentamento ao coronavírus em uma UBS, na zona leste de São Paulo,
não é raro que a médica generalista Liliane Bastos receba pacientes com
sintomas de ansiedade relacionados à pandemia. Um desses casos — uma mulher
casada, aproximadamente 25 anos, com muita falta de ar — chamou sua atenção.
"Estava
nervosa e chorava bastante. O marido disse que faria algo com ela caso os
filhos tivessem qualquer sintoma da covid-19." Liliane Bastos
Para Liliane, o
pânico de sua paciente é sintoma de mais um desafio trazido pelo
coronavírus. Diante da recomendação da Organização Mundial da Saúde de
permanecer em casa, o Brasil também tem que dar conta do agravamento da
violência doméstica: seguindo as previsões da ONU Mulheres e do Ministério da
Mulher, Família e Direitos Humanos, houve aumento de 17% no registro de
denúncias pelo canal Ligue 180. No
país em que, só
em 2019, 7 a cada 10 vítimas de feminicídio foram mortas dentro de seus lares,
ficar em casa certamente não signficia se manter segura.
Segundo
pesquisadora de gênero, especialista em sociopsicologia e relações públicas
Gabriela Moura, este é um momento prematuro para determinar uma causa única
para o aumento da violência doméstica, durante a quarentena.
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Segundo Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, denúncias de violência doméstica aumentaram 17% no Brasil após decreto de quarentena para conter coronavírus. Sabrina Cessarovice |
"Estamos
falando de um problema que não tem gênese única. A pandemia acaba acarretando
em um estresse maior para pessoas: ficar em casa é uma coisa, ficar em
casa porque o mundo exterior é perigoso é outra. Além da situação de
insegurança econômica, a proximidade física e o aumento do uso de substâncias
como fuga que também faz com que os parceiros se tornem mais violentos",
explica Moura, que foi destaque na web com o artigo "Violência
contra a mulher aumenta com a pandemia de covid-19". Embora frise
a importância do confinamento no controle da pandemia, a ativista não deixa de
cobrar as devidas ações das autoridades na proteção de camadas mais vulneráveis
da sociedade.
"O fim da
quarentena não acabará com a violência doméstica. Sabemos que o nosso sistema
de proteção a mulher já é deficitário. Essa discussão já acontece há anos em
relação ao horário de funcionamento da delegacia da mulher ou o atendimento que
deixamos de receber em hospitais. É uma obrigação do Estado proteger essas
mulheres. Assim como proporcionar abrigos e proteção para que mulheres possam
se manter afastadas desses homens, além de incentivar canais de denúncia.
"
Socorro
online
A promotora de
Justiça de São Paulo Gabriela Manssur é uma das figuras que tem articulado
novas redes de luta contra a violência de gênero. Ela está a frente do projeto
Justiceiras, uma iniciativa com 500 voluntárias na área do Direito, Psicologia
e Assistência Social que visa acolher mulheres vítimas de violência doméstica
na quarentena. De acordo com Manssur, a ideia do projeto é eliminar a
dificuldade no deslocamento para buscar ajuda e contribuir com as infomrações
necessárias para que a mulher possa denunciar o agressor.
"Essas
mulheres não conseguem sair de suas residências não só pela recomendação de
ficar em casa, mas também porque elas estão sob os olhares do agressor. Se já
há uma situação de violência, agora com a quarentena, essas mulheres ficam
muito mais expostas ao controle e agressividade", explica.
"Esse
projeto não terá uma atuação de atos de execução, mas informar o que fazer,
quem procurar, quais são os locais no qual essa mulher pode se dirigir."
Nayara Fernandes, do R7
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