Alberto
"Chino" Carias se emociona ao lembrar de Hugo Chávez
em
entrevista a VEJA, em Caracas (Manaure Quintero/VEJA)
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Alberto Carias defendia os ganhos
sociais do chavismo, mas culpava Maduro pela crise política. Leia a entrevista
exclusiva concedida a VEJA em Caracas
Alberto Carias, conhecido como
“El Chino”, era dos mais ferrenhos defensores do legado do
ex-presidente Hugo
Chávez e assessor político da Assembleia Nacional para Ciência e
Tecnologia, mas sua especialidade eram os conflitos armados. Chino era também
filósofo por formação e o líder do Movimento
Revolucionário Tupac Amaru (MRTA) na Venezuela,
que coordena atividades de alguns dos principais grupos de paramilitares
chavistas. Ele era procurado pela Justiça em 15 países. O chavista, de 60 anos, faleceu
na noite de domingo, 28, após uma operação na vesícula. Segundo fontes
ouvidas por VEJA, foi mais uma vítima da crise hospitalar – precisava
de remédios que não conseguiu encontrar no país.
Chino criticava duramente o
governo do presidente Nicolás
Maduro e o culpava pelo fracasso das políticas de Hugo Chávez.
Ao lado de alguns de seus oito escoltas, alguns que o cercavam empunhando
facões do tamanho de um braço, o líder chavista concedeu a seguinte
entrevista a VEJA, em Caracas,
em novembro.
Qual a diferença ideológica
entre o MRTA e o partido socialista, o Partido
Socialista Unido da Venezuela (PSUV), criado por Hugo Chávez?
A diferença é a forma de luta. Nós
acreditamos nas lutas violentas, clandestinas, armadas e também na via
eleitoral. Devemos pensar do ponto de vista político violentamente. Estou ao
lado do proletariado, seja na ilegalidade, como estive por décadas, ou agora na
legalidade. Agora, a revolução está ameaçada e considero que em breve voltaremos
para a luta clandestina. A extrema direita está atacando com muita força e a
democracia está ameaçada. Por isso devemos brigar em qualquer um desses campos.
Qual é a ameaça para a
revolução socialista?
Sou chavista, anti-imperialista,
revolucionário, não sou Madurista. Simpatizo mais com a ala militar e considero
que é a ala que acompanhou nossos vinte anos de clandestinidade até a conquista
ao poder. Fizemos isso primeiro de forma violenta, em 1992, e depois quando meu
comandante (Hugo Chávez) saiu da cadeia até que nós chegamos ao poder pela via
eleitoral. Estou apoiando o governo de Maduro pois preciso defender o legado de
Chávez. Prefiro isso que voltar para a época de tortura, presos políticos e repressão
que vivemos no passado.
Qual sua divergência com
Maduro?
O comandante Chávez aceitava
críticas, você podia dizer a ele até que o mataria na frente dele e ele
escutava. Agora não existe isso, é preciso corrigir esse caminho e respeitar as
instituições e as autoridades. A diferença entre eles é incrível, mas não
justifica a saída de Maduro. Maduro foi um excelente chanceler, mas ninguém
esperava que ele fosse morrer e nem que fosse pedir que votássemos por ele de
repente.
Quais foram os erros principais
de Maduro?
A insegurança é deixar
que a escassez de alimentos chegue a este ponto sem usar a força do apoio
popular. Mas a popularidade dele não é baixa como a oposição diz. A sorte é que
são tão ineptos e sem vontade política que parece que vivem na época das
cavernas. Calculo que possam ter uns 60% dos votos, mas não tem capacidade de
convocatória, mobilização e reação. Vemos isso cada vez que o deputado
chavista Diosdado Cabello pede mobilização nos programas de televisão. Se
a oposição tivesse mesmo todo esse apoio, já estavam no poder. O povo sabe o
que deixaria de ter se o governo mudasse.
O que deixaria de ter?
O mesmo que aconteceu na Argentina
com a Cristina Kircher e no Brasil com a Dilma: o investimento social seria
congelado, eles chamam isso de gastos públicos.
A divergência vem desde a morte
de Chávez?
Para nós, esse é um assunto muito
doloroso. Hoje, nosso comandante eterno deve estar ao lado de Jesus, Deus e os
apóstolos por seu cristianismo, por sua humildade e por tudo que fez pelos
pobres do mundo. A morte dele foi a pior de nossa pátria desde a primeira
república, foi o presidente e mais amado do mundo.
O senhor disse a Maduro o que
pensa sobre ele?
Não, ele me catalogaria de
contra-revolucionário. Chávez aceitava críticas, tinha atitude política. Se
estivesse vivo, nada disso estaria acontecendo. Ele era muito perspicaz.
Assim como Nicolás Maduro, o
senhor acha que a Assembleia Nacional está em desacato?
Não, acredito que ela seja
legítima e foi eleita pelo povo. Nós devemos respeitar a vontade do povo, mesmo
que vá contra a vontade do presidente. Se eu estivesse no poder, respeitaria a
vontade popular e deixaria que legislassem.
Qual é o futuro do chavismo?
Vamos para um processo de
recuperação do legado de Chávez nas mãos de Diosdado Cabello, Padriño López,
Miguel Torres e dos militares. Vamos reconstruir a revolução, precisamos neste
momento lutar dentro do marco da democracia para fortalecer as forças proletárias
que amam o nosso comandante eterno.
O senhor funciona como um líder
dos colectivos. Como eles operam?
O
nome colectivo é usado para estigmatizar e diminuir quem somos
pela extrema direita. Os movimentos revolucionários e populares, chamados
de colectivos, têm como função realizar trabalhos sociais no seio
das comunidades, sejam esportivos, culturais e organizacionais. No fundo,
também a defesa do processo revolucionário dentro do marco constitucional que
prevê a participação do povo da democracia venezuelana.
Qual seria um exemplo desse
trabalho?
Neste momento, controlamos as
filas contra o contrabando de produtos. Chegamos de madrugada e organizamos uma
fila para os deficientes físicos, outra para idosos e uma terceira para o resto
do povo. Nós não permitimos que uma pessoa leve dez sacos de arroz e outro
fique sem nenhum, para que a pouca alimentação chegue de forma equitativa.
Qual a relação hierárquica com
outros braços de segurança?
Respeitamos o trabalho deles, mas
às vezes a adrenalina dos nossos combatentes é grande. Além disso, tem zonas que
são impenetráveis pelas forças de segurança do Estado.
Como se resolvem as brigas
entre setores diferentes dos colectivos?
Pelo diálogo. Às vezes, quando as
coisas se tornam muito violentas, preciso intervir.
Que tipo de controle tem sobre
o que acontece no país?
Total e absoluto. Sabemos
quem é quem e o que fazem. Sabemos por exemplo quem está tentando
produzir um golpe de Estado que não deixaremos acontecer. Eu fui diretor
de segurança cidadã da cidade de Caracas, controlei a polícia metropolitana,
bombeiros, defesa civil, entendo disso.
Quantos homens estão
disponíveis para a defesa da revolução socialista?
Isso é segredo militar.
Qual o papel dos colectivos nas
atuais circunstâncias?
Vivemos em uma democracia
pacífica, participativa e plural, mas que ninguém se engane. Saímos da
clandestinidade mas temos nossos capuzes e armas nas mãos. Nunca as entregamos
e nunca as entregaremos. Se há golpe de Estado ou desconhecimento das
leis e programas sociais que conquistamos, defenderemos o país disso com
mobilizações nas ruas.
O senhor acha que as ruas da
Venezuela ainda verão muito sangue?
Não sei dizer, mas se isso acontecer
será de total responsabilidade dos golpistas.
Por Nathalia Watkins
Veja.com
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