Marcelo Odebrecht cita políticos do PMDB
em delação premiada
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Assista a
trecho da delação premiada do ex-presidente da Odebrecht, usada como base de
inquéritos contra políticos com foro privilegiado que tiveram a abertura
autorizada pelo Supremo Tribunal Federal.
O apoio da
Odebrecht às campanhas eleitorais de senadores e deputados federais que
beneficiavam a empresa durante seus mandatos era visto como um
"compromisso moral" por Marcelo Odebrecht, ex-presidente da
empreiteira. Ele explicou sua visão em trecho de sua delação premiada na
Operação Lava Jato. (assista no vídeo acima). Os depoimentos dele e
de diversos outros funcionários da empresa basearam 83 pedidos de inquéritos
feitos pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal
Federal (STF). Destes, 76 já foram autorizados pelo ministro Luiz Edson Fachin,
relator da Lava Jato no STF.
No trecho
acima, Marcelo Odebrecht passa mais de cinco minutos dando detalhes sobre o
sistema de repasses da empreiteira a políticos. Segundo ele, dois setores
mantinham relações em patamares distintos: o setor de negócios, que incluía as
diversas empresa do Grupo Odebrecht e lidava diretamente com políticos locais,
onde a Odebrecht tinham contratos e participavam de licitações, e havia Cláudio
Melo Filho, ex-diretor de relações institucionais, que mantinha contato com
parlamentares no Congresso Nacional, onde a empresa agia para tentar aprovar ou
derrubar leis, resoluções, medidas provisórias e outras peças de legislação em
benefício próprio.
Segundo
Marcelo, essa frente dupla de atuação "sempre dava um estresse" no
período eleitoral. "Minha preocupação era que quando você chegava na época
de campanha, (...) os nossos executivos estão muito focados nas campanhas
majoritárias, estados, onde eles têm negócios. Em geral, os negócios não olham
para o Congresso. O Congresso é um interesse meio difuso ao longo do tempo",
afirmou ele.
O executivo
explicou que havia dois tipos de acordo entre a Odebrecht e os deputados e
senadores: em alguns casos havia a definição de uma contrapartida
("compromisso explícito", nas palavras de Marcelo) da empreiteira em
troca de apoio em determinado caso. Em outros casos, os deputados federais e
senadores apoiavam a empresa sem uma contrapartida definida, mas criavam uma
"expectativa de contribuição" durante a campanha eleitoral.
"Talvez até fosse mais fácil, entre aspas, e mais ilegal, mas mais fácil,
se o cara pedisse na hora. Mas muitas vezes não é isso que acontece, muitas
vezes você cria a expectativa."
O problema
desse segundo tipo de acordo era a gestão interna do grupo para garantir que o
negócio beneficiado teria recursos para fazer o repasse no futuro. "O
Cláudio vinha com essa expectativa. Ele era o interlocutor, mas ele não tinha
sempre resultado, ele tinha que arrancar de algum negócio. E o negócio não
tinha nada, porque aquele assunto já foi resolvido", afirmou ele.
Marcelo
Odebrecht explica como tentava gestionar esse problema: "Eu dizia
'Cláudio, se tem uma medida provisória, se tem qualquer processo no Congresso,
você precisa do apoio de um senador, um deputado, seja assumindo um compromisso
explícito ou não, seja criando uma expectativa, sempre deixe claro com o
negócio que tem interesse nessa medida, que vai haver, por conta disso, um
compromisso. Mesmo que você não tenha fechado o compromisso na hora, você tem
um compromisso moral e o cara criou a expectativa.'"
"Se tem
uma medida provisória, se tem qualquer processo no Congresso, (...) sempre
deixe claro com o negócio que tem interesse nessa medida, que vai haver, por
conta disso, um compromisso. Mesmo que você não tenha fechado o compromisso na
hora, você tem um compromisso moral e o cara criou a expectativa."
Em seguida, os
investigadores pedem que Marcelo Odebrecht use a medida provisória 613, que
beneficiou a Braskem S/A, uma das empresas do grupo, como exemplo. Na resposta,
o ex-presidente da Odebrecht explicou que, sempre que era abordado por Cláudio
Melo Filho sobre apoios negociados entre parlamentares, ele instruída o então
diretor de relações institucionais a pedir autorização direto da empresa ou
negócio que se beneficiaria desse apoio. "Não é que eu não fosse autorizar
porque era lícito ou ilícito", respondeu ela, afirmando que não tinha
poder decisório na questão porque não era dele que sairia o dinheiro da
contrapartida aos congressistas.
"Eu dizia:
'Cuidado, se você está criando a expectativa, você provisione com o negócio,
porque na hora, daqui a três anos, se você for pedir praquele negócio, a fatura
vinha, aí você vai dizer: Olha, tal deputado, 500 mil. E ouvir: Por que que eu
vou dar? Aí você vai lembrar que o cara apoiou? Não. Avise a ele agora.'",
explicou ele.
Além de dar
detalhes sobre os procedimentos dessa "troca de apoios", o delator
ainda deu sua opinião pessoal sobre as relações entre a empreiteira e o
Congresso. Marcelo Odebrecht revelou que, mesmo tornando a gestão financeira
dentro dos negócios da Odebrecht mais difíceis, ele preferia os acordos
implícitos aos compromissos explícitos. "Você não cria uma relação
sustentável naquele ‘toma lá, dá cá’. Se você chegasse para um deputado: ‘Pô,
me apoia aqui’. E toda hora que você pede um apoio, o cara diz 'olha, eu quero
tanto’, não é uma relação sustentável, eu acho. Em geral, aquelas relações mais
duradouras são aquelas relações que ficam. O cara sempre te ajuda, e você está
sempre ajudando ele."
Leia abaixo
a íntegra do trecho em que Marcelo Odebrecht explica o
compromisso de apoiar financeiramente campanhas de parlamentares e sua
orientação sobre como esse apoio deveria ser alinhado diretamente com os
negócios da Odebrecht beneficiados:
Marcelo
Odebrecht: "A relação com o PMDB no Congresso, quer dizer,
com os principais caciques do PMDB no Congresso, ela se dava através de
Cláudio, Cláudio Melo [ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht]. O
que Cláudio sempre dizia para a gente é... Quer dizer, eu acho que, além de
Cláudio, todas as reuniões, tanto comigo quanto com os outros, eram bem
protocolares. Eu nunca tive nenhuma reunião com eles que não fosse protocolar,
assim como com os outros.
O que a
gente sabia, o que o Cláudio dizia pra gente, era que, no Senado, a pessoa a
quem ele sempre se referia, e várias vezes a gente sempre dizia, era o [Romero]
Jucá. Jucá era quem coordenava o PMDB no Senado, e o que o Cláudio falava pra
gente sempre era que todos os interesses financeiros, de campanha, tudo, do
Renan [Calheiros], do Eunício [de Oliveira], todo o resto do PMDB, eram
coordenados pelo Jucá. O que facilitava muito no nosso modo de ver.
E na Câmara
tinha a questão do Eliseu Padilha, certo? Que era quem coordenava um grupo, mas
era um pouco mais difuso, porque tinha também Eduardo Cunha. E aí, no caso do
Eduardo Cunha especificamente, a relação mais forte não era com o Cláudio. Com
o Eduardo Cunha a relação mais forte era com vários, tinha vários empresários
do negócio que conheciam o Eduardo Cunha.
Então, o
Cláudio era mais quem funcionava com o Jucá, coordenando os interesses do PMDB
no Senado, e com o Eliseu Padilha na Câmara. Aí tinham vários interlocutores
que devem ter relatados sobre o Eduardo Cunha nos próprios relatos deles.
Então isso
funciona. Agora o que o Cláudio sempre dizia pra gente, o termo que ele usava,
era a questão de assumir compromisso. Como é o detalhe desse compromisso ele
vai poder aferir.
E ele sempre
que vinha pra mim: ‘olha você precisava assumir um compromisso... pro cara, pra
esse medida...’ Eu dizia: ‘Cláudio, veja bem. Então alinhe com o negócio.’
Naquele conceito, é o seguinte: Minha grande preocupação era que quando você
chegava na época de campanha, quem... A gente sempre tinha... Os nossos
executivos estão muito focados nas campanhas majoritárias, estados, onde eles
têm negócios. Em geral, os negócios não olham para o Congresso. O Congresso é
um interesse meio difuso ao longo do tempo.
Aí, quem
tinha interface com o Congresso durante os quatro anos era o Cláudio. Aí o Cláudio
chegava na véspera da eleição e dizia: olha, eu preciso... E vinha a
expectativa de contribuição, seja tendo sido alinhada com contrapartida
específica, seja tendo criado expectativa, mas vinha. De grandes, valores
grandes.
Por exemplo,
um cara que ajudava muito a gente vinha com um pedido grande. E aí sempre dava
um estresse, porque o Cláudio vinha com essa expectativa, ele era o
interlocutor, mas ele não tinha sempre resultado, ele tinha que arrancar de
algum negócio. E o negócio não tinha nada, porque aquele assunto já foi
resolvido.
Então,
sempre que Cláudio dizia, eu dizia: ‘Cláudio, se tem uma medida provisória, se
tem qualquer processo no Congresso, você precisa do apoio de um senador, um
deputado, seja assumindo um compromisso explícito ou não, seja criando uma
expectativa, sempre deixe claro com o negócio que tem interesse nessa medida,
que vai haver, por conta disso, um compromisso. Mesmo que você não tenha
fechado o compromisso na hora, você tem um compromisso moral e o cara criou a
expectativa.’
Então, tinha
pessoas, por exemplo, que Cláudio dizia, que brigavam pela gente. Ele pedia e o
cara fazia. Ele nunca pediu nada na hora. Mas, obviamente, é aquele cara que
vai chegar, na véspera de uma eleição, e criou uma expectativa enorme, não vai deixar
de apoiar ele.
Então, por
exemplo, uma pessoa que ele sempre usou como referência era o Geddel. O Geddel
era um cara da relação antiga dele [de Cláudio Melo Filho], do meu pai. Eu
sempre escutei deles dois. Eu conheço o Geddel de forma protocolar, mas eles
sempre diziam: ‘Geddel é um cara que briga pela gente, qualquer coisa que você
pede lá, Geddel vai, se desgasta, faz e acontece. Agora, se prepare, porque ele
vai criar uma expectativa na época de eleição aquém do que a gente daria para
qualquer outro deputado.’ [Ele é interrompido e questionado se ele quis dizer
‘além’, e não ‘aquém’.] Além, muito além do que a gente daria.
Então, esse
tipo de... Você concentra o esforço em alguns deputados e congressistas, e cria
a expectativa. Eu via de uma maneira até mais legítima quando uma pessoa cria
uma expectativa em cima de um apoio que vai dar, ainda que seja você dizer que
tem caixa 2, que não tinha que ter isso, do que se o cara pedisse na hora.
Agora, eu
não sei precisar aí, quem vai poder precisar aí qual era o tipo de relação, se
era essa questão da expectativa, ou se era aquele que exigia contrapartida na
hora, só o Cláudio vai poder dizer isso.
Agora, eu
sempre pedia pra ele, uma vez que tivesse esse compromisso, seja explícito,
seja uma expectativa gerada de apoio, que ele aprovasse ou gerasse a provisão
no negócio."
Investigador:
Tanto no Senado quanto na Câmara, tinham parlamentares com quem vocês
conversavam. Esses parlamentares, eles tinham uma função de arrecadação do
partido, de algum grupo específico, ou era alguma coisa própria?
Marcelo
Odebrecht: "Não. Aqui eu estou falando do PMDB. No caso do
PMDB, o que Cláudio informava era que ele concentrava as discussões dele com
Jucá no Senado e com Eliseu Padilha na Câmara. Tinha o Eduardo Cunha, mas o
Eduardo Cunha era mais diretamente com os outros empresários que ele conhecia.
O Eduardo Cunha conhecia muitos empresários da empresa."
Investigadores:
Tá. Mas o Jucá e o Padilha então representavam um grupo?
Marcelo
Odebrecht: "Representavam um grupo. Representavam digamos
assim: o que Cláudio sempre me dizia era o seguinte: ‘Olha, eu acerto com o
Jucá, está resolvido o PMDB lá do Senado. Eu acerto com o Eliseu, está
resolvido o PMDB da Câmara.’"
Investigador:
O caso da MP 613, de interesse da Braskem, como é que a coisa mais ou menos
funcionou?
Marcelo
Odebrecht: "Todas... Se tinha interessa da Braskem, ele
avisava, eu dizia: ‘Cláudio, se você vai assumir um compromisso com alguém,
você alinhe com o pessoal da Braskem, seja esse compromisso explicitado na
hora, seja expectativa gerada, alinhe lá com o pessoal.’ Agora, é uma coisa que
eu sempre dizia pra ele.
Ele vinha...
Muitas vezes, era mais fácil pra ele tentar obter minha autorização. Não é que
eu não fosse autorizar porque era lícito ou ilícito, simplesmente lhe dizia:
‘Cláudio, o dinheiro não vai sair de mim. Então você busque a autorização de
quem vai pagar.’ Então sempre informava isso a ele, para ele, mesmo que não
tivesse [compromisso explícito].
Talvez até
fosse mais fácil, entre aspas, e mais ilegal, mas mais fácil, se o cara pedisse
na hora. Mas muitas vezes não é isso que acontece, muitas vezes você cria a
expectativa de... E aí eu dizia: Cuidado, se você está criando a expectativa,
você provisione com o negócio, porque na hora, daqui a três anos, se você for
pedir praquele negócio, a fatura vinha, aí você vai dizer: Olha, tal deputado,
500 mil. E ouvir: Por que que eu vou dar? Aí você vai lembrar que o cara
apoiou? Não. Avise a ele agora. Entendeu?"
Investigador:
E aí então tu fazia não uma vinculação objetiva, mas alguma vinculação entre
negócio lá atrás, de onde havia um provisionamento para pagar aquela doação no
futuro, né?
Marcelo
Odebrecht: "Não... Aí, o que havia é o seguinte: Com essa
disciplina, com o tempo... No início, foi difícil, mas... Eu falei: ‘Cláudio...
Aí, quando chegava na campanha, mais ou menos, os negócios já sabiam quem iria arcar
com cada deputado."
Investigador:
...porque, lá atrás, as empresas tinham feito um acordo, um acerto, para
resolver um problema ou uma questão...
Marcelo
Odebrecht: "...Explícito ou não. Quer dizer, ou foi feito
um acordo, e aí o Cláudio vai explicar se foi feito um acordo, ou foi gerada
uma expectativa por conta de um apoio que deu. Caso a caso."
Investigador:
Como é que vocês controlavam isso tudo assim?
Marcelo
Odebrecht: "Cada negócio controlava o seu."
Investigador:
Todos esses detalhes, esses dados. Vocês controlavam de que maneira isso?
Marcelo
Odebrecht: "Aí cada um sabe o compromisso que assumiu. Eu
não sei como é... Cada um sabe o compromisso que assumiu. Eu acho que grande
parte... O que eu vejo é o seguinte: Eu acho que as pessoas com quem a gente
tinha uma relação mais forte, em geral, em geral, fica naquela questão da
expectativa. Porque, em geral, você não cria uma relação sustentável naquele
‘toma lá, dá cá’. Se você chegasse para um deputado: ‘pô, me apoia aqui’. E
toda hora que você pede um apoio, o cara diz ‘olha, eu quero tanto’, não é uma
relação sustentável, eu acho. Em geral, aquelas relações mais duradouras são
aquelas relações que ficam. O cara sempre te ajuda, e você está sempre ajudando
ele."
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