© Andressa
Anholete A jurista Eliana Calmon.
|
Baiana de Salvador – terra natal
da empreiteira Odebrecht, bastante criticada pela jurista-, ela foi a
primeira mulher a ocupar o cargo de ministra do Superior Tribunal de Justiça.
Em 2014, filiada ao PSB, tentou sem sucesso uma vaga no Senado Federal, e
posteriormente anunciou apoio ao candidato tucano Aécio Neves, que
disputou e perdeu a presidência naquele ano. Veja a entrevista concedida por
Calmon ao EL PAÍS por telefone.
Pergunta. Como você
avalia a Lava Jato até o momento?
Resposta. A Lava Jato
foi um divisor de águas para o país. A partir dela vieram à tona as entranhas
do poder brasileiro, e sua relação com a corrupção em todos os níveis
de Governo. Mas para que tudo isso fique muito claro, seja passado a limpo de
fato, precisa se estender para todos os poderes. Muitos fatos envolvendo o
Executivo e o Legislativo vieram à tona, mas o Judiciário ficou na sombra, é o
único poder que se safou até agora.
P. Você acha que
membros do Judiciário também tiveram um papel no escândalo de corrupção?
R. O que eu acho é o
seguinte: a Odebrecht passou mais de 30 anos ganhando praticamente
todas as licitações que disputou. Enfrentou diversas empresas concorrentes,
muitas com uma expertise semelhante, e derrotou todas. Será que no Judiciário
ninguém viu nada? Nenhuma licitação equivocada, um contrato mal feito, que
ludibriasse e lesasse a nação? Ninguém viu nada? Por isso eu digo que algo está
faltando chegar até este poder. Refiro-me ao Judiciário como um todo, nas três
instâncias. Na minha terra, na Bahia, todo mundo sabia que ninguém ganhava
nenhuma causa contra a Odebrecht nos tribunais. O que eu questiono é que em
todas estas décadas em que a empreiteira atuou como organização criminosa
nenhum juiz ou desembargador parece ter visto nada... E até agora nenhum
delator mencionou magistrados.
P. Mas não existe um
corporativismo no Judiciário que dificultaria processos contra os magistrados?
R. Os juízes exercem
atividade jurisdicional para serem isentos. Ponto. É o seguinte: o juiz de
primeiro grau é processado perante o próprio tribunal. O de segundo grau é
processado pelo Superior Tribunal de Justiça, e os ministros pela Suprema
Corte.
P. Como vê a indicação
do senador Edison Lobão (PMDB-PA), investigado pela Lava Jato, para a
presidência da Comissão de Constituição e Justiça do Senado?
R. Um presidente que
está com seu ibope tão baixo quanto está o Michel Temer deveria ser
mais cauteloso. Do ponto de vista jurídico nada impede que ele articulasse com
a bancada do PMDB no Senado para colocar o Lobão na presidência. Mas em razão
do envolvimento dele no processo da Lava Jato melhor seria que ele ficasse de
fora. Por outro lado, a decisão era da bancada do partido, que é majoritária,
então isso é normal. Se não fosse o Lobão ia botar quem? Está todo mundo
comprometido. Você fecha o olho e pega um parlamentar... Pegou um corrupto!
Pegou outro, corrupto!
Eliana Calmon em sua residência.
Andressa Anholete
P. O que achou da
indicação do ministro da Justiça licenciado, Alexandre de Moraes, para a
vaga de Teori Zavascki no Supremo Tribunal Federal?
R. Eu gostei da
indicação. Aí todo mundo me pergunta “ah, mas o Moraes é político!”. Olha, eu
gostei porque conheço ele e conheço os outros que foram cotados para assumir a
vaga... E aí você conclui o que quiser. Esta história dele ser político, ora,
eu conhecia os outros candidatos e não tinha ninguém bobo. Todos no STF têm
inclinações políticas. Não é por amizade que apoio o nome dele. O que acontece
é que ele é jovem e muito talentoso, tem livros maravilhosos sobre direito. É
brilhante como intelectual e como militante na advocacia. Agora, se ele vai
vender a alma ao diabo ou não, aí temos que ver...
P. Enquanto os
processos da Lava Jato na primeira instância avançam com rapidez, no STF o
ritmo é diferente. O que provoca essa lentidão na Corte Suprema?
R. O processamento das
ações nos tribunais anda a passos de cágado. Não é só o Teori Zavascki ou o
Edson Fachin [ex-relator e atual relator da Lava Jato no STF] que são
responsáveis por isso. A tramitação do processo é muito lenta, e é óbvio que
aqueles que detêm foro especial não têm interesse em fazer com que o processo,
com que essas ações penais andem rápido. A legislação é cruel, há uma
dificuldade de fazer andar esses processos. Veja na primeira instância, por
exemplo: o Sérgio Moro recebe uma denúncia, e ele faz um juízo de valor,
acolhendo ou não. Se acolheu, o denunciado já se torna réu. Agora no foro
especial, quando o relator recebe a denúncia, ele nem inicia a ação penal. Ele
abre uma intimação para que o indiciado na denúncia venha se defender. Só
depois dessa defesa é que ele leva para a corte. Isso estende muito o processo,
é muito demorado. E só depois disso começa o processamento.
P. Temer foi muito
criticado por ter nomeado Moreira Franco, citado dezenas de vezes na Lava
Jato, para um ministério. Acha correta a nomeação?
R. Eu acho que se o
Ministério Público com base em fatos incontroversos faz uma reclamação formal
contra um ministro, eu entendo que não deveria ser nomeado. Ele [Temer] deu
aquela desculpa meio esfarrapada [que afastaria quem fosse denunciado] mas a
nação teve que engolir. No final de contas é a mesma situação que ocorreu com o
Lula, mas dessa vez em decisão monocrática o ministro Celso de Mello avaliou
que ele poderia tomar posse.
P. O juiz Sérgio
Moro tem sido muito criticado desde o início da Lava Jato pelo que alguns
consideram como sendo um abuso nas prisões preventivas. Como você vê essa questão?
R. O Moro é muito
dinâmico, conhece muito este processo específico, uma vez que ele acompanha o
caso e seus desdobramentos desde o início. Isso dá celeridade ao processo, e
acho que isso é algo que deve ser aplaudido. Quanto às críticas envolvendo prisões
preventivas, a culpa é do STF que não julga os pedidos de liberdade feitos pela
defesa. Em última instância, os pedidos de habeas corpus cabem ao Supremo.
0 comentários:
Postar um comentário
Obrigado pelo seu comentario.
Fique sempre ligado do que acontece em nossa cidade!