Lorena foi
vítima do vazamento de imagens íntimas
(Foto: Lorena Gomes/ Arquivo pessoal)
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Estudo da ONG Safernet mostra que
crime cresceu 120% em um ano. Mulheres são mais de 80% das vítimas do vazamento de imagens íntimas.
Os casos de vazamento de imagens
íntimas, popularmente conhecidas como “nudes”, sem autorização das pessoas que
aparecem nas imagens, ganham cada vez mais espaço. É o que afirma o delegado
titular da Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática (DCRI) do Rio,
Alessandro Thiers.
“Em primeiro lugar, com ampla
vantagem, nós temos os crimes de vazamento de fotos e vídeos íntimos, com
pessoas ofendidas na sua honra. Depois, temos a pedofilia, que as pessoas
infelizmente botam bastante na internet. Em terceiro lugar, temos as fraudes financeiras,
de uma forma geral. Em quarto lugar, nós temos os crimes de apologia: a atos
criminosos, homofobia, racismo, intolerância religiosa”, enumera Alessandro
Thiers, sem revelar os números de casos registrados.
Dados da ONG Safernet, entidade
que monitora crimes e violações dos direitos humanos na internet, mostram que
no ano passado foi registrado o maior número de casos de vazamentos de fotos e
vídeos íntimos contra a vontade das pessoas expostas. Em 2014, a ONG recebeu a
notificação de 224 casos do tipo, contra 101 em 2013. Os números são de âmbito
nacional.
Mulheres são as principais vítimas
As mulheres, segundo o delegado, são os principais alvos de vazamentos de fotos e vídeos íntimos no Rio. "As mulheres são as maiores vítimas desse tipo de crime [chamados de pornografia de vingança]", disse o delegado Alessandro Thiers.
Mulheres são as principais vítimas
As mulheres, segundo o delegado, são os principais alvos de vazamentos de fotos e vídeos íntimos no Rio. "As mulheres são as maiores vítimas desse tipo de crime [chamados de pornografia de vingança]", disse o delegado Alessandro Thiers.
As análises da Safernet corroboram
esta afirmação: segundo a ONG, quando são analisados de maneira mais aprofundada,
é possível perceber que os casos de sexting — divulgação de
conteúdos eróticos com a ajuda da tecnologia de celulares e computadores —
podem ser considerados um problema de gênero.
Apesar de homens e mulheres
compartilharem as imagens, elas são as que mais sofrem com o vazamento de
imagens indesejadas e representam 81% das vítimas. Os homens são apenas 16% do
total de queixas e 3% das vítimas não tiveram o gênero identificado.
Além de serem do sexo feminino, o
perfil das vítimas que têm imagens vazadas é jovem. De acordo com as
estatísticas da ONG, 53% têm menos de 25 anos de idade. Destas, 25% delas são
menores, com idade entre 12 e 17 anos. Três estados do Sudeste estão no topo
das notificações de vazamento de “nudes” contra a vontade das vítimas. São
Paulo, que registrou 15 casos, o Rio de Janeiro, com oito; e Minas
Gerais, com sete.
Vítima lamenta ter confiado na
pessoa errada
Em abril de 2014, a estudante Lorena Gomes, de 22 anos, que mora em Campos, no Norte-Fluminense, sofreu um dos maiores baques de sua vida. Na porta de uma festa, ela descobriu que imagens íntimas suas estavam circulando por vários celulares por meio do Whatsapp. Elas teriam sido enviadas por um amigo, que foi a única pessoa que teve acesso às imagens. Na época, Lorena não denunciou o caso.
Em abril de 2014, a estudante Lorena Gomes, de 22 anos, que mora em Campos, no Norte-Fluminense, sofreu um dos maiores baques de sua vida. Na porta de uma festa, ela descobriu que imagens íntimas suas estavam circulando por vários celulares por meio do Whatsapp. Elas teriam sido enviadas por um amigo, que foi a única pessoa que teve acesso às imagens. Na época, Lorena não denunciou o caso.
“Não fui à delegacia, nem nada, eu
já estava morando em outra cidade e, na época, eu só queria que aquilo
acabasse. Achei que, ficando em silêncio, estava fazendo o certo”, conta
Lorena.
Após inicialmente se culpar pelo
ocorrido, Lorena passou a expor a questão como uma maneira de conscientizar
outras mulheres sobre o risco do compartilhamento de imagens íntimas. “Devemos usar
isso como impulso para subir, evoluir, superar da melhor maneira possível.
Mostrar, não só para as pessoas, mas principalmente para nós mesmos, que todos
erramos, mas podemos superar sempre”, refletiu a estudante.
Sentimento de culpa
De acordo com Juliana Cunha, coordenadora psicossocial do Safernet, o sentimento de culpa costuma ser comum nestes casos. “Geralmente as vítimas sofrem com muitos transtornos, mentais, físicos e psicológicos”, afirma Juliana.
De acordo com Juliana Cunha, coordenadora psicossocial do Safernet, o sentimento de culpa costuma ser comum nestes casos. “Geralmente as vítimas sofrem com muitos transtornos, mentais, físicos e psicológicos”, afirma Juliana.
Segundo ela, o perfil dos crimes
contra a honra pela internet mudou com a popularização dos smartphones e de
aplicativos. “A gente tinha, antes de 2012, imagens mais frequentemente
divulgadas em páginas de redes sociais. Os aplicativos aceleraram isso, e os
números de casos de pornografia de vingança aumentaram”, explica Lorena.
Identificando abusos
A psiquiatra Carmita Abdo, da Sociedade Brasileira de Psiquiatria, concorda que a situação pode causar graves danos às mulheres, como depressão profunda e até tentativas de suicídio. Para ela, as mulheres devem estar atentas aos sinais que podem identificar uma situação de abuso.
A psiquiatra Carmita Abdo, da Sociedade Brasileira de Psiquiatria, concorda que a situação pode causar graves danos às mulheres, como depressão profunda e até tentativas de suicídio. Para ela, as mulheres devem estar atentas aos sinais que podem identificar uma situação de abuso.
“A gente tem que passar desconfiar
a partir do momento que documentar a intimidade passa a ser uma insistência.
Ele começa a querer fazer alguma coisa diferente, com o discurso de que deseja
algo mais excitante. Principalmente em situações de crise no relacionamento”,
afirma a psiquiatra, que lembra que as mulheres mais jovens acabam sendo presas
mais fáceis para abusadores por conta da inexperiência, que as leva a confiar
cegamente no parceiro.
A escritora e ativista feminista
Daniela Lima afirma que o crescimento dos números de vazamentos de imagens
íntimas é um reflexo de como a sociedade ainda vê o corpo da mulher como
propriedade.
“Mulheres não têm autonomia sobre
seus próprios corpos, de modo que o nosso ‘não’ é respondido com uma violência
brutal: a vingança esteve e está muito presente nos relacionamentos. O maior
índice de feminicídio é no ambiente familiar: companheiros, namorados, pais e
irmãos matam mulheres que, de alguma forma, dizem ‘não’. Esse tipo de
comportamento sempre existiu e a tecnologia se tornou um instrumento dele.
Portanto, o que deve ser combatido coletivamente é o patriarcado – e não a
tecnologia”, conta Daniela.
A escritora ressalta que a
educação pode ajudar a reduzir este quadro preocupante, com a inclusão de
debates de gêneros nas escolas, por exemplo. Ela também destaca que é preciso
combater o papel de que a mulher, caso tenha enviado as imagens para um
parceiro, seja considerada culpada, quando é, na verdade, uma vítima.
“A mesma sociedade que não discute
a cultura do estupro, mas a roupa que a mulher estava usando ou o lugar onde
ela estava quando foi estuprada, tenta responsabilizar as mulheres que se
deixaram filmar. Nos dois casos, deixamos de discutir atitudes criminosas dos
homens para culpar as vítimas. É uma crueldade extrema. Temos que agir contra
esses limites impostos sobre o comportamento das mulheres: o problema não está
nas roupas, no lugar que se anda ou nos vídeos, mas machismo”, afirma a escritora.
Como denunciar
Para Juliana Cunha, da Safernet, um dos principais problemas enfrentados pelas vítimas é a luta para apagar os registros das imagens vazadas sem consentimento. “O marco civil da internet foi um avanço, porque em seu artigo 21, ele garante o direito ao esquecimento. Se a empresa não responder, ela pode ser responsabilizada. Esperamos que as empresas também contribuam, porque a pessoa é revitimizada cada vez que a imagem é repassada”, explica.
Para Juliana Cunha, da Safernet, um dos principais problemas enfrentados pelas vítimas é a luta para apagar os registros das imagens vazadas sem consentimento. “O marco civil da internet foi um avanço, porque em seu artigo 21, ele garante o direito ao esquecimento. Se a empresa não responder, ela pode ser responsabilizada. Esperamos que as empresas também contribuam, porque a pessoa é revitimizada cada vez que a imagem é repassada”, explica.
O delegado titular da DRCI, diz
que a vítima de um crime pela internet não precisa ir até a DRCI, localizada na
Cidade da Polícia, no Jacarezinho, na Zona Norte do Rio. “A vítima pode fazer
um registro em qualquer delegacia, que pede ajuda à DRCI”, orienta.
Ele lembra ainda que a internet
não é uma terra sem lei. Os crimes que punem de acordo com o Código Penal
também podem ser aplicados ao meio eletrônico e serem julgados pelas mesmas
penas. “Se a injúria for praticada por meio que facilite a sua divulgação, a
pena aumenta em um terço”, explica Thiers.
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