Alemanha reconheceu pela primeira vez que cometeu genocídio
na Namíbia. TOBIAS SCHWARZ/POOL/AFP - 28.5.2021
Autoridades
também anunciaram que vão pagar cerca de R$ 7 bilhões para ajudar no
desenvolvimento e na reconstrução do país
A Alemanha reconheceu pela primeira vez que cometeu um "genocídio" contra as populações das etnias hereros e namas da Namíbia no início do século XX, durante o período colonial, uma decisão recebida como um "passo na direção correta" por parte das autoridades do país africano.
"Do ponto
de vista atual, hoje qualificaremos estes acontecimentos como o que são: um
genocídio", declarou o ministro alemão das Relações Exteriores, Heiko
Maas, em um comunicado.
A Alemanha
também anunciou que vai pagar ao país 1,1 bilhão de euros (cerca de R$ 7
bilhões) para ajudar no desenvolvimento e na reconstrução do país.
A quantia será
paga ao longo de um período de 30 anos e deve beneficiar de maneira prioritária
os descendentes das duas etnias. Do ponto de vista jurídico, não se trata de
uma compensação, e este reconhecimento não abre caminho para uma "demanda
legal de indenização".
"A
aceitação por parte da Alemanha de que um genocídio foi cometido é um primeiro
passo na direção correta", declarou à AFP Alfredo Hengari, porta-voz do
presidente namibiano, Hage Geingob.
"É a base
da segunda etapa, que consiste em pedir desculpas e prever uma reparação",
disse.
Nas próximas
semanas, o presidente da Namíbia organizará encontros com autoridades das
comunidades de hereros e namas, sobre as "modalidades de aplicação do que
foi estabelecido com a Alemanha", disse Hengari.
O anúncio é
resultado de cinco anos de árduas negociações entre os dois países.
A Namíbia foi
colonizada pela Alemanha entre 1884 e 1915. Os colonos alemães mataram dezenas
de milhares de hereros e namas durante os massacres executados entre 1904 e
1908. Por vários historiadores, tratou-se do primeiro genocídio do século XX.
Perdão pelas
"atrocidades"
"À luz da
responsabilidade histórica e moral da Alemanha, vamos pedir perdão à Namíbia e
aos descendentes das vítimas pelas atrocidades cometidas", afirmou o
ministro alemão.
"Não se
pode apagar o passado. O reconhecimento da falha e o pedido de perdão são, no
entanto, um passo importante para superar o passado e construirmos juntos o
futuro", completou o chefe da diplomacia alemã.
Em uma
tentativa de reconciliação, a Alemanha entregou à Namíbia, em 2019, os ossos de
membros das tribos herero e nama exterminados. A secretária de Estado para
Assuntos Exteriores, Michelle Müntefering, pediu "perdão do fundo do
coração".
Um gesto
considerado insuficiente pelos descendentes e pelas autoridades da Namíbia, que
exigiam um pedido oficial de desculpas e uma compensação.
A Alemanha
expressou oposição em diferentes ocasiões, alegando que milhões de dólares
foram repassados à Namíbia desde sua independência em 1990 para contribuir com
seu desenvolvimento.
Embora o
trabalho de memória histórica na Alemanha sobre o período nazista seja, em
geral, considerado exemplar, o de seu período colonial na África, da segunda
metade do século XIX ao início do século XX, foi deixado de lado por muito
tempo.
Campos de
concentração
As tribos
herero representam atualmente quase 7% da população do país, contra 40% no
início do século XX.
Privados de
suas terras e de seu gado, os hereros se revoltaram em 1904 contra os colonos
alemães e mataram mais de 100 entre estes últimos.
Enviado para
reprimir a rebelião, o general alemão Lothar von Trotha ordenou seu extermínio.
Os namas se revoltaram um ano mais tarde e sofreram o mesmo destino.
Ao menos 60 mil
hereros e quase 10 mil namas foram assassinados entre 1904 e 1908. As forças
coloniais alemãs usaram técnicas genocidas: massacres em larga escala, exílio
no deserto, onde milhares de pessoas morreram de sede, e campos de concentração
como o tristemente célebre de Shark Island.
Restos de
ossos, em particular os crânios das vítimas, foram enviados à Alemanha para
experimentos científicos de caráter racial. O médico Eugen Fischer, que
trabalhou em Shark Island e cujos escritos influenciaram Adolf Hitler, pretendia
demonstrar a "superioridade da raça branca".
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