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Dilma
Roussef: quando ela estava à frente da Casa Civil
atribuições
técnicas da pasta foram atropeladas
(Fabio
Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
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Em 2009, quando Lula assinou a
medida provisória 471, agora investigada na Operação Zelotes, o servidor Luiz
Alberto dos Santos alertou a então titular da Casa Civil para a forma afoita
com que o assunto era tratado
O servidor Luiz Alberto dos Santos
conhece como poucos os meandros da burocracia dos governos do PT. Concursado do
Senado e professor da Escola de Administração Pública da Fundação Getulio
Vargas, ele atuou por mais de onze anos, entre janeiro de 2003 e julho de 2014,
como subchefe da Casa Civil, o ministério mais importante da República. Nesse
período, assessorou José Dirceu, Dilma Rousseff, Erenice Guerra, Antonio
Palocci, Gleisi Hoffmann e Aloizio Mercadante - todos ministros da Casa Civil.
Sua tarefa era eminentemente técnica. Em novembro de 2009, logo depois de o
ex-presidente Lula assinar a medida provisória que concedia incentivos fiscais
às montadoras, agora investigada pela Polícia Federal, Santos alertou Dilma
sobre a forma afoita com que o assunto estava sendo tratado. Foi ignorado.
Qual foi a razão do alerta? No
governo do presidente Lula, e depois também no da presidente Dilma, tornou-se
muito comum o ministro levar a medida provisória e despachar diretamente com o
presidente. Saía do gabinete já com o sinal verde. No mesmo dia, à noite,
chegava a proposta de MP, às vezes pelo e-mail, com a seguinte orientação:
"Olha, tem que sair amanhã". Isso é absolutamente equivocado.
Enfraquece a própria lógica da análise de mérito da matéria, uma das
atribuições da Casa Civil.
O senhor está dizendo que
medidas provisórias eram aprovadas sem a devida análise técnica? O
papel de coordenação governamental da Casa Civil é exatamente o de dizer se uma
matéria pode ou não ser submetida à decisão presidencial. Isso não estava
acontecendo. Por isso, a nossa preocupação. Ao não se seguir o rito técnico de
análise da matéria, o risco de ocorrer uma decisão manipulada e vinculada a
interesses é muito maior. O presidente tem legitimidade para tomar a decisão
diretamente, sem seguir os ritos, mas ele é responsável por isso.
As medidas provisórias e os
decretos que estão sob investigação do Ministério Público tramitaram dessa
maneira? Sim. O Ministério da Fazenda levava direto para o presidente
as suas propostas de MP, e a orientação era "para sair amanhã".
Chegava a ser constrangedor. O sistema existe para prevenir problemas. A
instância final de análise técnica e jurídica é a Casa Civil.
O Ministério Público suspeita
que essas medidas que beneficiaram o setor automobilístico foram compradas. Tenho
visto tudo isso com preocupação. É óbvio que ninguém assinou um contrato firmando
o compromisso de entregar uma MP a A, B ou C, mas não é totalmente absurdo que
isso possa ter acontecido. Nesse caso específico, do setor automotivo, se
alguém pagou, foi enganado, comprou um terreno na Lua. Era quase impossível que
aquele benefício não fosse prorrogado.
Essa MP sob suspeição foi
"analisada" e aprovada pela Casa Civil em menos de 24 horas?Exatamente.
Isso aconteceu em muitos casos.
O senhor informou a então
ministra Dilma Rousseff? A Casa Civil passou por um processo de
enfraquecimento muito forte em relação à área econômica. Na nossa área, nós
sempre questionávamos isso. Decisões tomadas, anunciadas, questionávamos
internamente. O papel do burocrata é trabalhar para dentro do governo. Nesses
casos se fazia um alerta: "Olha, essa medida provisória não deu para
analisar, estamos preocupados".
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“Nosso
pessoal cansou de alertar”
(Wilson
Dias/ABR/VEJA)
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Quando o senhor alertava a
então ministra Dilma, havia algum tipo de explicação? Normalmente
tínhamos reuniões nas quais esses assuntos podiam ser falados: "Olha, tal
situação está acontecendo". Sempre se dizia que "é matéria que já foi
decidida, já foi levada ao presidente pelo próprio ministro". O nosso
pessoal na área técnica cansou de alertar, mas sempre ouvia: "Isso está
resolvido, vai ter de sair no Diário Oficial".
A medida provisória dos carros,
que não passou pelo crivo técnico da Casa Civil, envolvia uma renúncia fiscal
de mais de 1 bilhão de reais. Todas essas matérias envolviam renúncias
tributárias enormes, muitas vezes mal estimadas. Nós cansamos de alertar:
"Olha, isso aí não está de acordo com a Lei de Responsabilidade
Fiscal".
Alertavam o pessoal do
Ministério da Fazenda? Sim, mas eles sempre diziam que aquilo já
estava decidido. Davam uma envernizada na exposição de motivos para tentar
justificar, faziam umas contas lá que ninguém sabia se estavam certas e levavam
direto ao presidente. Às vezes, a gente ficava sabendo dos detalhes pela
imprensa.
Dilma não se insurgia contra
essa situação? Ela era a ministra da Casa Civil que colocou como
prioridade zero o PAC, o Minha Casa Minha Vida, o marco regulatório do pré-sal
e algumas outras coisas. Mas no varejão, e particularmente nessas matérias
econômicas e tributárias, ela não se envolvia muito.


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