Supremo julga ação que tramitava havia mais de 50 anos | Rio das Ostras Jornal

Supremo julga ação que tramitava havia mais de 50 anos

Superior Tribunal Federal
Mais antigo processo na Corte, de 1959, contestava doação de terra no MS.
Ação questionava legalidade das concessões, validada nesta quinta.

Por 5 votos a 3, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) mantiveram nesta quinta-feira (15) doações de cerca de 200 mil hectares de terras no Mato Grosso do Sul para empresas que foram contestadas, em julho de 1959, pela Procuradoria-Geral da República. O julgamento desta tarde pôs fim ao mais antigo processo que tramitava na Corte. Em quase 53 anos de tramitação, o processo passou pelo gabinete de nove ministros relatores e acumulou 12 volumes e 3 apensos, totalizando cerca de 2,5 mil páginas. O primeiro relator do processo foi o ministro Cândido Motta Filho, que morreu em 1977.

Conforme o procurador que entrou com a ação, Oscar Corrêa Pina, as doações seriam ilegais por não terem sido autorizadas pelo Senado. A Constituição de 1946, vigente à época, determinava que as concessões de terras de até 10 mil hectares deveriam ser analisadas pelos senadores.

De acordo com o processo, a área alvo das concessões corresponde a cerca de 40 mil km², o equivalente a duas vezes o estado de Sergipe. O caso foi alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), aberta no Senado, em 1955, para investigar doações de terras públicas, com área superior ao limite constitucional, sem prévia autorização do Senado.

Segundo informações do processo, as empresas alegam que os contratos de concessão são legais, pois elas teriam sido encarregadas pelo antigo estado do Mato Grosso de promover a colonização do local, introduzindo 300 famílias de pecuaristas e agricultores, além de realizar benfeitorias e de desenvolver a região.

O advogado da empreiteira Carmargo e Corrêa, uma das empresas que recebeu concessões, Ewerton Azevedo Mineiro, afirmou que seria "materialmente impossível" anular os contratos realizados, porque isso implicaria em dissolver uma séria de negócios feitos ao longo dos anos com base na doação das áreas. "O contrato [de concessão] envolveria obras, serviços, fazer coleta de cadastro de colonos, demarcação da área. Como restituir ao estado essas terras que os colonos e outro negociadores fizeram negócios com esses lotes? Como esta Corte Suprema pode desfazer tudo isso sem que essas pessoas participem desta lide?", apontou o advogado.

Relator do caso desde 2003, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso, negou o pedido da PGR para anular os contratos de doação. Ele reconheceu que as concessões não obedeceram a Constituição da época, mas decidiu que, em nome do princípio da segurança jurídica, os contratos devem ser mantidos.

"Não vejo como, nem por onde pronunciar, meio século depois, a nulidade das concessões sem grave ofensa aos princípios constitucionais e não menores transtornos a relações de vida, não menos importantes. Não podemos é destituir situações de vida estabilziadas há 60 anos", disse Peluso.

"Não há hoje corte constitucional que decida como mera divagação acadêmica. Tem que ser tangível", completou o ministro Luiz Fux ao citar a necessidade adequar as normas à realidade das pessoas.

Votaram com o relator, os ministros Luiz Fux, Rosa Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. O ministro Gilmar Mendes se declarou impedido, e não participaram da sessão desta quinta Joaquim Barbosa e Celso de Mello. Três ministros discordaram da maioria e afirmaram que não seria possível manter os contratos de doação de terras que não foram analisados pelo Senado, conforme a lei vigente na época.

"A passagem do tempo não pode levar o tribunal a dar o dito pelo não dito e mitigar o texto constitucional. O fato consumado para mim há de estar em harmonia com a Constituição Federal. E pouco importa que a controvérsia seja originária da década de 50, o que importa é saber se este tem uma ação que não foi fulminada", disse o ministro Marco Aurélio.

O ministro Ricardo Lewandowski chamou atenção para as disputas de terras indígenas e os problemas ambientais que existem na região. "O estado diz que vamos desalojar milhares de trabalhadores, pelo me parece é que vamos desalojar latifundiários. Mato Grosso e Mato Grosso do Sul são terras sabidamente com problemas ambientais, indígenas. Não me sinto a vontade para validar toda esta extensa área", disse.
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