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Ricardo Moraes/Reuters
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O incêndio no Museu Nacional revela a falta de
cuidado do poder público com o acervo histórico e científico do País e foi
classificado como um desastre anunciado por pesquisadores e dirigentes de
instituições ouvidos pelo Estado neste domingo, 2. “A dúvida
não era se algo assim poderia acontecer, mas quando iria acontecer”, disse
Walter Neves, antropólogo conhecido como “pai da Luzia”, por ter descrito o fóssil que é considerado
o fóssil humano mais antigo das Américas, com 11 mil anos – item do acervo do
local.
“O museu estava
jogado apodrecendo, incluindo a parte elétrica”, criticou Neves, professor
aposentado da Universidade de São Paulo (USP), ainda abalado com a notícia. O
incêndio, diz, “é uma consequência direta do descaso do poder público.” O
pesquisador criticou ainda o destino dos recursos. “Gastaram milhões para
construir um museu do futuro (Museu do Amanhã), enquanto um museu centenário,
que guarda a história do Brasil, ficou largado às traças.”
Segundo relatos
de pesquisadores e funcionários da instituição, os problemas se acumulam há
vários anos. Frequentadora do prédio histórico há 21 anos, como estudante,
pesquisadora e professora, a antropóloga Adriana Facina disse que desde que lá
chegou os funcionários relatam a falta da manutenção que a construção merece.
“É um descaso total com a pesquisa, o conhecimento e a cultura. É muito triste
ver o prédio em chamas”, disse ao Estado aos prantos, ao ver
as imagens do incêndio.
Entre os
dezenas de funcionários que acompanharam o incêndio, o clima era de desespero.
“Minha vida toda estava aí dentro”, disse o bibliotecário Edson Vargas, de 61
anos, que trabalha há 43 anos na instituição.
Presidente do
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), ligado ao Ministério
da Cultura, Kátia Bogéa resumiu em uma frase o incêndio que consumiu o Museu
Nacional: "Uma morte anunciada". E sem conseguir esconder a tristeza,
sentenciou: "Patrimônio não tem como reconstruir. Acabou, acabou."
Ela disse que
se o Museu Nacional já tivesse feito a obra de restauração pleiteada, que
foi aprovada há três meses pelo BNDES, isso não teria
acontecido. "Ia ter todo um sistema de prevenção e combate a incêndio,
diminuiria em muito a destruição”, afirmou.
“Não tem
investimento nessas áreas”, reclamou. “É o acervo de memória do País inteiro,
mas não tem recursos.” O Iphan, segundo ela, tem discutido com os grupamentos
do Corpo de Bombeiros de cada Estado a aprovação de um protocolo para orientar
a atuação nos prédios históricos e acervos. "A gente perdeu nossa memória,
nossa história", continuou a presidente. "A gente não vai ter mais
Luzia. Luzia morreu no incêndio."
Segundo o
zoólogo e paleontólogo Hussam Zaher, que foi aluno do museu nos anos 1980,
houve um incêndio na ala de herpetologia que só não se espalhou para a
instituição inteira porque era um ambiente fechado. “Foi uma tragédia
anunciada”, lamentou ele, que também viu de perto o incêndio que destruiu quase
toda a coleção de cobras do Instituto Butantã, em São
Paulo.
“É a ciência
brasileira indo embora”, resumiu o físico e historiador da ciência Ildeu
Moreira, presidente da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência. “A
possibilidade de acontecer desastres como esse aumenta a cada dia. O patrimônio
brasileiro está sendo destruído todos os dias pelo descaso.”
Para o
presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), o físico Luiz Davidovich,
professor da UFRJ, foi um "golpe duro na ciência nacional". Segundo
ele, é um desastre irrecuperável, com repercussão internacional. "É uma
consequência do descaso das autoridades com a ciência, que afeta agora não
apenas o futuro, mas a memória do País."
Ele lembrou que
o museu vinha lutando há tempos para se recuperar dos cortes orçamentários.
"É mais um capítulo da triste história do desmonte da ciência brasileira.”
Emergência
No Rio, outros
museus com acervos importantes correm risco. O Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) tem
adotado providências para reformar ou restaurar prédios antigos que abrigam
coleções históricas. Um exemplo é o Museu Nacional de Belas Artes, que recebeu
impermeabilização em sua cobertura e torre de arrefecimento. O Museu da
República teve igualmente obras emergenciais realizadas, sendo recuperada sua
varanda e restaurada sua claraboia.
O Palácio Rio Negro,
em Petrópolis, também passou por escoramento emergencial de sua varanda. Já o
Museu Imperial, na mesma cidade da região serrana fluminense, passou por obras
emergenciais no telhado de sua biblioteca.
Amando Pupo,
Antonio Gonçalves Filho, Herton Escobar e Roberta Pennafort
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