Por 14 votos a
1, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça manteve o afastamento do
governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC). O resultado impede o retorno
do político à chefia do Poder Executivo estadual. Formou-se maioria
qualificada, com 2/3 dos votos, pela manutenção da medida. O colegiado é
composto por 15 ministros.
Witzel foi
afastado na última sexta-feira (28 de agosto) pelo ministro Benedito Gonçalves.
A medida vale por 180 dias e foi determinada a pedido da Procuradoria-Geral da
República na Operação Tris In Idem, que investiga irregularidades e desvios na
saúde. Witzel nega as acusações se
diz inocente.
O governador
manifestou-se logo após o décimo voto ter sido proferido, quando formou-se a
maioria necessária. "Respeito a decisão do Superior Tribunal de Justiça.
Compreendo a conduta dos magistrados diante da gravidade dos fatos
apresentados. Mas, reafirmo que jamais cometi atos ilícitos", escreveu
Witzel no Twitter.
"Não
recebi qualquer valor desviado dos cofres públicos, o que foi comprovado na
busca e apreensão. Continuarei trabalhando na minha defesa para demonstrar a
verdade e tenho plena confiança em um julgamento justo", acrescentou.
"Desejo ao governador em exercício, Cláudio Castro, serenidade para
conduzir os trabalhos que iniciamos juntos e que possibilitaram devolver ao
povo fluminense a segurança nas ruas e, com isso, a esperança em um futuro
melhor", concluiu.
Benedito
Gonçalves foi acompanhado por Francisco Falcão, Nancy Andrighi, Laurita Vaz,
Maria Thereza Moura, Og Fernandes, Luís Felipe Salomão, Raul Araújo, Isabel
Galloti, Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi, Sergio Kukina — que defendeu a
prisão do governador — e Humberto Martins, que embora só fosse obrigado a se
manifestar em caso de empate, por ser presidente do colegiado, também quis proferir
seu voto contra o governador. Todos concordaram em manter o afastamento por 180
dias.
No início do
julgamento sobre o afastamento de Wilson Witzel, o advogado de defesa, Nilson
Naves, disse que ele “em momento algum foi ouvido” no inquérito. Em seguida, a
subprocuradora Lindôra Araujo, que pediu o afastamento, disse que ele teve
oportunidade de se manifestar, mas recusou.
A Procuradoria
Geral da República (PGR) enviou uma manifestação ao STJ na terça (1º) na qual
afirmou que continua "convicta" da necessidade da prisão do
governador afastado. A PGR também afirmou que deve oferecer nova denúncia
contra ele.
O julgamento
Em breve voto,
o ministro Benedito Gonçalves disse decidiu pelo afastamento com base no Código
de Processo Penal — que prevê a adoção de medidas cautelares. “Foi pedido na
cautelar pelos motivos expostos a prisão preventiva. Entendi que a prisão
preventiva era mais gravosa, entendi por optar por medida menos gravosa, que
era afastamento”, disse.
"Em
um momento como esse, de pandemia, é impossível que alguém, que esteja sendo
acusado e investigado, possa continuara exercer um cargo tão importante em um
segundo mais importante da federação. Há gravidade dos fatos no processo. Há
comprovação de compras em dinheiro vivo e eu não vejo como não referendar a
decisão do ministro relator", disse Francisco Falcão ao acompanhar o
relator.
A ministra
Nancy Andrighi afirmou ter ficado impressionada ao receber o processo.
"Pelo que pude ler, com muito cuidado, vi a possibilidade do relator
decretar as medidas individualmente. Há elementos suficientes de crimes e
indícios de autoria", disse. "As medidas cautelares são adequadas
para prevenir a continuidade dos delitos como o acesso às provas. A aplicação
do afastamento se mostra adequada e proporcional", concluiu.
Segundo a
ministra Laurita Vaz, há fortes evidências do cometimento de crimes
gravíssimos, envolvendo em primeiro plano supostamente o governador do estado e
a primeira-dama, que na condição de advogada teria recebido entre agosto de
2019 e maio de 2020 mais de R$ 500 mil, em repasses considerados ilícitos de
empresas ligadas à prestação de serviços hospitalares, algumas de fachada e
operadas por laranjas.
“Há elementos
que demonstram que a ordem pública estava vulnerada, de modo a confirmar
medidas enérgicas para sustar ações ilícitas. Há evidência de vazamento de
informações da investigação pois há informações que os acusados foram
informados das investigações. Foram encontrados documentos rasgados, em clara
tentativa de destruição para apuração dos fatos”, disse a ministra.
Embora tenha
votado pelo afastamento do governador, a ministra Maria Thereza Moura ponderou
que a medida só poderia ter sido determinada pelo colegiado, não pelo relator
de forma monocrática. "O Ministério Público foi expresso no sentido de
que, além dos fatos narrados na denúncia, diversos outros merecem ser
aprofundados inclusive com relação ao grau de atuação da organização criminosa
em questão, que possui espectro de incidência delitiva em praticamente todos os
setores do governo do estado do Rio de Janeiro."
“Apurados os
fatos que são objetos de investigação, concluído esse prazo, o ministro
Benedito e o tribunal verificarão sobre a necessidade ou não de prorrogação do
período de afastamento. Mas se o relator entender, antes, que não haja
necessidade de submeter o governador a essa medida cautelar, certamente relator
e tribunal tomarão o rumo assertivo para a invalidação”, disse o ministro Og
Fernandes, ao acompanhar o relator.
Em seu voto, o
ministro Salomão apontou que, com andamento das investigações
"verificou-se em tese a existência de prováveis ilícitos muito mais
abrangentes que aqueles referentes às ações de combate à pandemia, envolvendo
período que vai desde a campanha de 2018, até a presente data, com acentuado
aparelhamento do estado, incluindo nomeações em cargos chave, como secretários
de estado, de pessoas dentro do esquema e vinculada a três grupos supostamente
criminosos”, disse Salomão.
“Já há
evidências fortíssimas. Tenho por imprescindível a manutenção das medidas, a
fim de sobrestar desde logo as práticas lesivas, bem assim para impedir a
reiteração de supostas condutas criminosas, também pelo fato de os investigados
ostentarem cargos na administração. Detêm ainda poderes para concretamente
destruírem provas, intimidarem testemunhas e prosseguirem nas supostas
empreitadas criminosas”, afirmou Campbell.
Divergência
A divergência
foi aberta pelo ministro Napoleão Nunes Maia, que votou contra o afastamento do
governador. "Esse afastamento deveria pertencer aos políticos do Rio, à
Assembleia, e não a uma decisão monocrática", disse. Napoleão ainda
criticou o fato de o governador não ter sido ouvido.
“Penso que é
absolutamente inútil e patética a defesa diante do delegado de polícia. O
delegado está empenhado em comprovar o que ele suspeita. Além disso, o relator
decretou a prisão de tantos e do governador, não. Por que ele não foi preso
também? Porque o ministro relator hesitou nessa medida extrema porque sabe que
todos esses indícios podem ser destruídos. Os que estão presos não são têm foro
no STJ”, disse.
“O pouco amor
que se tem tido ultimamente pelo justo processo jurídico e o desapreço que se
tem tido pelas liberdades individuais têm conduzido alguns autores imprudentes
a relacionar o garantismo com a impunidade”, acrescentou Nunes Maia. “Isso nos
levou a um punitivismo desenfreado.”
Gabriela
Coelho e Leonardo Lellis Da CNN, em Brasília e São Paulo
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