Pandemia ameaça presença de mesários nas eleições municipais. TSE / Divulgação |
“Se eu for
convocada vou tentar de alguma forma a liberação na Justiça Eleitoral ou cobrar
dos cartórios medidas de proteção”, disse a publicitária Mariana Marcondes, de
28 anos. Mesária na eleição municipal de 2012, ela se recorda dos momentos de
concentração de pessoas quando os eleitores vão às urnas. “Depois de encerrada
a votação se forma uma aglomeração para devolver livros, urnas e imprimir os
boletins.”
Diante do
cenário incerto da pandemia do coronavírus para os próximos meses,
o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) está especialmente preocupado com o
possível “apagão” em uma etapa-chave do processo das eleições municipais deste
ano: a convocação de mesários.
O processo, que
será deflagrado na primeira semana de agosto, precisa reunir um exército de 2
milhões de pessoas, entre voluntários e convocados. Os nomes que já atuaram na
função em eleições passadas são os primeiros no radar dos tribunais regionais
eleitorais, mas especialistas e ex-desembargadores temem que uma onda de
atestados médicos e a judicialização das convocações abram um vácuo sem
precedentes na função.
Mesária em três
eleições consecutivas, sendo a última em 2016, a assessora Mayra Angels, de 28
anos, lembra que este ano os representantes da Justiça Eleitoral que compõem a
mesa receptora de votos terão de ficar três horas a mais na sala de votação
após decisão do TSE. “Isso aumenta a exposição. A pandemia vai assustar as
pessoas que forem convocadas. Tomamos todos os dias cuidados dentro de casa,
mas há muito compartilhamento de material e documento para conferir no dia da
votação”, disse.
Já o assistente
de compras Cláudio Soares, de 46 anos, que foi mesário por seis eleições e
chegou a presidente de mesa, afirmou que, em caso de problema técnico na urna,
é inevitável que se forme uma fila, o que pode gerar tumulto na seção. “Se eu
fosse convocado, pediria dispensa por questões sanitárias.”
Para evitar um
“apagão” de mesários, o TSE vai lançar uma ação midiática no mês que vem. O
primeiro passo será uma campanha nacional na TV protagonizada pelo médico
Dráuzio Varela estimulando voluntários e garantindo que o processo será feito
sob um rígido protocolo de proteção sanitária. Em outra frente, a Corte deve
fechar convênios com universidades, funcionários públicos e, em último caso,
até com o Exército para montar a rede de mesários.
“A principal
preocupação do TSE é garantir que as eleições municipais sejam seguras para
eleitores, mesários, servidores e quem mais trabalhar nos dias de votação”,
disse ao Estadão o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do tribunal.
Ele afirmou que
a Corte instituiu uma consultoria sanitária, integrada pela Fiocruz e pelos
hospitais Sírio-Libanês e Albert Einstein para definir as providências e os
protocolos a serem seguidos. “Precisamos da colaboração de brasileiros
patriotas, preferencialmente que não sejam do grupo de risco do novo
coronavírus, para ajudar a Justiça Eleitoral a realizar o rito mais importante
da democracia, que é a escolha de quem vai nos governar e representar”, afirmou
o ministro.
Multa. Quem for
convocado e não comparecer estará cometendo crime de responsabilidade, mas, na
prática, a penalidade é muito branda: multa de R$ 3,50. Isso quando é aplicada.
“Deve haver este ano uma avalanche de atestados e muita judicialização”, disse
o ex-desembargador do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo André Jorge.
Por outro lado, avaliou Jorge, a abstenção também deve crescer muito entre o
eleitorado. Pela lei qualquer eleitor pode ser convocado na hora para cumprir a
função de mesário se os escalados para a tarefa faltarem no dia da votação. O
risco disso acontecer será maior se a Justiça Eleitoral reduzir o número de
mesários de quatro para três.
“Sem mesário
não tem eleição. Essa é a preocupação central do TSE. Como os eleitores vão
reagir à convocação? A dificuldade é evitar que a seção deixe de funcionar por
causa de mesário. Com quatro mesários é mais confortável porque, se dois
faltarem, a seção ainda funciona. Mas se forem três mesários e tiver falta, o
primeiro eleitor que chegar pode ficar de castigo”, disse advogado eleitoral
Rafael Morgental, que foi por 16 anos servidor do TRE do Rio Grande do Sul.
Medidas. O plano
original do TSE era ampliar o número de urnas eletrônicas para dividir mais o
eleitorado e, assim, evitar aglomerações e filas. Mas, conforme revelou o
Estadão, uma guerra de recursos e a pandemia da covid-19 atrasaram a licitação
milionária de compra de novos equipamentos para as eleições deste ano.
Apesar de
manter o processo em andamento, o próprio TSE admitiu não haver mais tempo
hábil para o uso das novas urnas em novembro, quando os brasileiros escolherão
prefeitos e vereadores. Com menos urnas, a Justiça Eleitoral começou a fazer um
remanejamento de eleitores e, com isso, a média de pessoas por seção eleitoral
saltará de 380 para 430. A convocação dos mesários será realizada entre agosto
e setembro.
Entre as
medidas de redução de danos do TSE na pandemia, o presidente da Corte aboliu a
identificação biométrica neste ano. Após ouvir infectologistas, o tribunal
concluiu que há possibilidade de aumento da chance de infecção, uma vez que o
leitor do sistema não pode ser higienizado frequentemente, além da
possibilidade de aglomerações nas seções eleitorais.
Apesar do
cenário nebuloso, o ex-ministro do TSE Henrique Neves se mostra otimista.
“Daqui até novembro vai dar tempo de equacionar tudo. Pessoas que já contraíram
covid e estão curadas podem se voluntariar e contribuir com o Brasil.”
Agência
Estado
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