O empréstimo citado agora por Valério — no valor de R$ 707 mil — foi assinado em 2004, na época em que a SMP&B era agência de publicidade do governo mineiro, na gestão Aécio. |
SÃO PAULO. O operador Marcos
Valério Fernandes disse em acordo de colaboração premiada assinado com a
Polícia Federal (PF) que o tesoureiro de campanhas de Aécio Neves (PSDB-MG),
Oswaldo Borges da Costa, quitou em 2005 um empréstimo fraudulento da SMP&B
com o Banco Rural, descoberto durante as investigações da CPI dos Correios.
Borges da Costa já foi mencionado
por delatores da Odebrecht como responsável pela coleta de valores para
campanhas de Aécio e, na época do empréstimo, era presidente da Codemig, empresa
de economia mista responsável pelas principais concessões públicas e obras do
governo estadual.
O empréstimo citado agora por
Valério — no valor de R$ 707 mil — foi assinado em 2004, na época em que a
SMP&B era agência de publicidade do governo mineiro, na gestão Aécio. Seria
tratado como uma transação privada qualquer, não fosse por um detalhe: seus
avalistas foram o então secretário de governo e braço direito do governador,
Danilo de Castro, e o presidente da Assembleia Legislativa de Minas à época, Mauri
Torres (PSDB).
Na colaboração assinada com a PF,
Valério contou que depois de entrar nas contas da sua agência, os recursos
teriam sido sacados em dinheiro vivo e repassados aos políticos que avalizaram
o empréstimo, mesmo modelo adotado no mensalão federal e que beneficiou o PT
nos primeiros anos do governo Lula.
A descoberta do contrato com DNA
tucano durante a CPMI dos Correios, em 2005, obrigou os envolvidos a buscarem
uma forma de viabilizar a quitação do empréstimo, segundo Valério. Em setembro daquele
ano, Oswaldo Borges teria entregue os valores destinados a este propósito a
Ramon Hollerbach, sócio de Valério condenado no processo do mensalão do PT a 27
anos de prisão.
Em 2007, quando empréstimo era
tratado como suspeito, o então ministro do STF Joaquim Barbosa encaminhou um
pedido de investigação do caso ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais. O então
Procurador-Geral de Justiça de Minas, Jarbas Soares, restringiu a apuração à
tomada de depoimento de funcionários do governo estadual, que atestaram a
lisura da licitação vencida à época pela agência de Valério e Ramon. O MP não
realizou perícias nas contas da SMP&B.
O laudo 376/2006 da Polícia
Federal, obtido pelo GLOBO, mostra que à semelhança do que foi descoberto
durante as investigações do mensalão petista, a maior parte do dinheiro do
empréstimo avalizado pelos políticos tucanos (R$ 563,5 mil de R$ 707 mil) foi
sacada na boca do caixa por emissários da SMP&B, sob a justificativa de
“pagamento de fornecedores” da agência.
LUCROS DISTRIBUÍDOS
As semelhanças com o caso petista
não param por aqui. No caso tucano, o Banco Rural não exigiu dos avalistas do
empréstimo comprovação de renda ou bens para lastrear o empréstimo. O banco
também deixou de identificar quem realizou os saques ao informá-los ao Banco
Central (Bacen). Tal conduta descumpre normas do Bacen e ajudou a condenar
dirigentes do Rural no julgamento do mensalão no STF, em 2012.
Os documentos obtidos pelo GLOBO
mostram que após tomar o empréstimo, a SMP&B apresentou balanço à Junta
Comercial de Minas, em março de 2005, sem contabilizar a operação de R$ 707
mil. Seis meses depois, já sob impacto do escândalo do mensalão, Valério
retificou seus livros contábeis incluindo a operação e informando que R$ 630
mil do total creditado à empresa teria sido objeto de “lucros distribuídos” ao
sócio Ramon Hollerbach e a Renilda Santiago, mulher de Valério. Agora, ele diz
que o dinheiro foi, na verdade, entregue aos políticos que avalizaram a
operação.
A omissão dos empréstimos nos
registros contábeis também ocorreu em relação aos empréstimos tomados para
irrigar o PT. No caso petista, o tesoureiro Delúbio Soares e o então presidente
do partido José Genoino foram avalistas de operações para empresas de Valério,
consideradas em 2012 pelo STF como forjadas para dissimular desvio e
distribuição de recursos a aliados.
Em depoimentos, Mauri Torres e
Danilo de Castro explicaram a participação como avalistas do empréstimo como um
pedido trivial de Ramon Hollerbach, durante um almoço em Belo Horizonte. “Seria
usado para cobrir despesas da empresa, que estaria em dificuldades
financeiras”, disse Mauri, à PF. “Houve uma reunião e, num ato quase sem
sentido, foi proposto a ambos assinarem um empréstimo para atender interesses
pessoais do declarante”, repetiu Hollerbach. Em ofícios praticamente idênticos
enviados ao procurador-geral mineiro durante a apuração do caso, anos depois,
eles disseram que deram o aval na condição de “cidadãos comuns”, em “ato da
vida civil” sem vinculação com o cargo que ocupavam.
O escândalo do mensalão, em 2005,
levou à exclusão dos nomes de Castro e Torres do contrato do Rural, a pedido
dos dois. O banco não contestou a exclusão dos avalistas, o que chamou a
atenção da PF.
Castro ocupou o cargo de
secretário de Governo durante os 12 anos da administração tucana em Minas,
entre 2003 e 2014, nos governos Aécio e de Antônio Anastasia (PSDB). Torres
permaneceu presidente da Assembleia no primeiro mandato de Aécio (2003-2006) e
foi líder do governo no segundo (2007-2010). Eleito deputado novamente em 2011,
renunciou para virar conselheiro do Tribunal de Contas de Minas Gerais
(TCE-MG), cargo que ocupa até os dias atuais.
CREDIBILIDADE QUESTIONADA
O GLOBO perguntou ao senador Aécio
Neves, por meio de sua assessoria, se ele autorizou Oswaldo Borges a quitar o
empréstimo para a SMP&B e o que ele fez em relação a Danilo de Castro
quando soube que seu secretário de Estado era avalista de um empréstimo
suspeito. Em nota, sua assessoria informou que as questões “não têm qualquer
relação com o senador”, pois “trata-se de uma transação privada, que nada tem a
ver com a atividade pública dos citados”.
O advogado de Ramon Hollerbach,
Estevão Melo, informou que seu cliente “nunca teve atribuições financeiras na
SMP&B”, por isso nunca teria recebido recursos de Oswaldo Borges. Segundo
ele, Valério era o responsável pelas finanças e “nunca mencionou que a
SMP&B quitou a dívida com recursos de terceiros”.
Para Melo, o delator é uma pessoa
de “credibilidade duvidosa”, que desde o julgamento da Ação Penal 470 “vem tentando
negociar acordos de colaboração, sempre com insucesso”. O advogado criticou a
transferência de Valério para a a Apac de Sete Lagoas, “quando havia mais de
duzentos presos na sua frente”, enquanto outros condenados do mensalão “se
submeteram à regular jurisdição do STF para obter as transferência”.
“A homologação de uma colaboração
premiada não iria trazer benefícios à Justiça e nem esclarecimentos à
sociedade, mas apenas vantagens ao pretenso delator”, acredita Melo.
O advogado Sânzio Baioneta Nogueira,
que defende tanto Mauri Torres quanto Danilo de Castro, disse que a acusação de
Valério é “fantasiosa” e uma “inverdade”. Para ele, os fatos noticiados pelo
delator foram objeto de apuração do Ministério Público que, “acertadamente, não
vislumbrou qualquer irregularidade” por parte de seus clientes.
Sobre Castro, ele disse considerar
“lamentável que um criminoso confesso, conhecido nacionalmente por todos os
órgãos de persecução penal, venha a denegrir levianamente a imagem de um homem
com 40 anos de vida pública e carreira ilibada”. Sobre Mauri, disse que ele
“possui total consciência de retidão que sempre acompanhou sua atuação
profissional”.
A defesa de Oswaldo Borges da
Costa informou não ser possível se manifestar sobre o caso, na medida em que
não conhece o teor das declarações de Valério e nem é possível saber se elas
terão validade jurídica, ou seja, se serão homologadas pelo STF.
Agência O Globo
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