O comissário de Saúde e Segurança Alimentar da União Europeia (UE), Vytenis Andriukaitis (Foto: Comissão Europeia) |
Em entrevista exclusiva ao G1,
Vytenis Andriukaitis fala que já alertou Brasília sobre as falhas no controle
da carne brasileira e deixou claro que 'a bola agora está com o Brasil'.
Desde que foi deflagrada a
operação Carne Fraca, que investiga irregularidades nos frigoríficos
brasileiros, as autoridades da Europa e do Brasil estão em queda de braço. A
União Europeia apontou falhas
no controle de qualidade da carne brasileira na semana passada e
pede a adoção de novas ações de fiscalização sanitária pelo Brasil. Em
entrevista exclusiva ao G1, o comissário de Saúde e Segurança
Alimentar da União Europeia (UE), o lituano Vytenis Andriukaitis, subiu o tom e
disse que poderá fazer novas sanções ao Brasil se o país não cumprir as
exigências da UE.
Andriukaitis é o ministro do bloco
responsável em garantir a segurança dos alimentos que chegam até as mesas dos
cidadãos europeus. No final de março, imediatamente após o deflagrar da
operação “Carne Fraca”, Andriukaitis visitou o Brasil, onde se reuniu com o
ministro da Agricultura, Blairo Maggi. Logo em seguida, o europeu enviou um
time de inspetores de Bruxelas até o Brasil para uma auditoria aprofundada –
durou quase um mês - sobre os frigoríficos autorizados a exportar carne para o
mercado europeu.
Entretanto, os resultados dessa auditoria,
concluída em maio, não foram positivos, e Andriukaitis enviou uma carta para
Maggi pedindo novas medidas por parte do governo brasileiro. Após essa
auditoria, a União Europeia proibiu toda a importação de carne de cavalo do
Brasil e impôs mais controles sobre o frango brasileiro.
Na semana passada, o ministro
interino da Agricultura, Eumar Novacki, disse que o relatório
de inspeção técnico ainda estava sendo respondido e voltou
defender a qualidade da carne brasileira.
Ao G1, Andriukaitis
apontou alguns pontos críticos na produção de carne brasileira, reiterou o
pedido de mais controles por parte das autoridades brasileiras e reafirmou que
a Europa poderá adotar novas medidas restritivas sobre o comércio de carne
entre a UE e o Brasil.
Veja os principais trechos da
entrevista de Andriukaitis:
Após a publicação do relatório
dos auditores da União Europeia em frigoríficos brasileiros, a existe a
possibilidade de a UE bloquear as exportações de carnes brasileiras? Do que
isso dependeria?
Esse relatório indica claramente
nossas sérias preocupações sobre a segurança alimentar dos produtos importados
do Brasil. Imediatamente depois que fomos informados das fraudes [no setor das
carnes], tomamos uma série de medidas muito rigorosas, incluindo a suspensão
das importações dos frigoríficos envolvidos na fraude que tinham sido
autorizados a exportar para a UE. Além disso, reforçamos os controles sobre as
importações provenientes do Brasil diretamente nas fronteiras da UE.
Por causa das conclusões
preocupantes dessa ampla auditoria realizada pela Comissão Europeia em maio
passado, eu escrevi para o ministro da Agricultura brasileira [Blairo Maggi]
solicitando a exclusão de todos os frigoríficos de carne de cavalo e empresas exportadoras
de cavalos da lista de estabelecimentos autorizados a exportar para a UE.
Também pedimos a introdução de controles sistemáticos microbiológicos
pré-exportação sobre 100% da carne de frango, de boi e produtos derivados.
A proteção da saúde dos europeus é
a razão principal de qualquer decisão que tomamos e estamos acompanhando de
perto a evolução da situação no Brasil. Portanto, se o Brasil se recusar a
adotar as medidas solicitadas, seremos obrigados a considerar medidas
adicionais de salvaguarda.
Na base dos resultados do
relatório, os padrões de segurança alimentar brasileiros respeitam os padrões
europeus ou não?
Precisamos ser francos. À luz do
escândalo da Carne Franca, e considerando o impacto sobre a credibilidade dos
controles oficiais no Brasil, os resultados da auditoria exigem uma ação
urgente das autoridades brasileiras. Essa auditoria levanta preocupações
importantes que já comunicamos ao Brasil. Entre elas, está a falha em corrigir
as deficiências nos controles. Algo já apontado em auditorias anteriores. A
Comissão Europeia continuará vigiando e já anunciei que uma auditoria de
acompanhamento será realizada no final de 2017 para avaliar a eficácia dessas
medidas.
Quais foram as garantias
fornecidas pelo governo brasileiro sobre a qualidade da carne exportada para a
UE?
O Brasil deve aplicar imediatas e
robustas ações para controlar a qualidade de sua carne. Expressei na carta que
enviei ao ministro Maggi todas minhas sérias preocupações nesse sentido,
solicitando medidas imediatas pelo seu Ministério. A bola agora está com as
autoridades brasileiras. Se elas se recusarem a aplicar essas medidas, terei
que propor novas ações apropriadas que afetarão a carne proveniente do Brasil.
A auditoria da UE mostrou que
os principais problemas referem-se à carne de aves e de cavalo. E as carnes
bovinas e suínas?
É verdade que as situações mais
críticas foram identificadas em particular na carne de cavalo, aves e nos
produtos derivados da carne. Mas as exportações de carne bovina - nas quais o
Brasil é um importante parceiro comercial da UE - também foram abordadas na
auditoria. Não por acaso, os números que indiquei na carta ao ministro Maggi
mostram como a carne bovina exportada do Brasil para a UE diminuiu 38% nos
últimos meses. Os produtores de carne bovina estão também sendo controlados.
Quanto à carne de porco, a UE não importa carne de porco do Brasil.
Se a UE decidir interromper as
importações de carne do Brasil, existem mercados alternativos onde os europeus
podem comprar carnes?
Este é um ponto hipotético. De
onde as importações virão é uma questão das empresas do setor de alimentos. A
minha prioridade como Comissário Europeu para a Segurança da Saúde Alimentar é
continuar a garantir que as exportações que chegam à UE sejam seguras. O Brasil
é, sem dúvida, um dos mais importantes parceiros comerciais da UE em produtos
alimentares, e em particular de carne. De fato, o Brasil é o primeiro
fornecedor de produtos agrícolas para a UE, com US$ 13,1 bilhões de exportações
em 2015, a maior parte matéria-prima (soja e café), e 1,7 bilhão de euros de
produtos de origem animal, principalmente carne bovina e aves. Nossa intenção
nunca foi cortar os laços comerciais entre a UE e o Brasil, mas sim garantir
que medidas adicionais, em particular controles nas fronteiras, bem como
auditorias, fossem realizadas após esse escândalo de fraude no setor das
carnes. A proteção da saúde dos consumidores europeus é um fator determinante
em qualquer decisão sobre as importações do Brasil. E é por isso que, se as
autoridades brasileiras se recusarem a adotar as medidas solicitadas ou
falharem em sua implementação, mesmo parcialmente, a Comissão Europeia tomará
qualquer medida adicional necessária para proteger a saúde dos consumidores da
UE.
Por Carlo Cauti, G1
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