Distribuição de botijões de gás e de cestas básicas da Cufa, nas comunidades de Acari e Vigário Geral .Gil Cunha / CUFA / divulgação |
A decisão foi
tomada na semana em que duas pessoas morreram durante operações policiais que
interromperam distribuição de cestas básicas
Rio - O
governador Wilson Witzel determinou que as polícias Civil e Militar evitem
realizar operações de busca e apreensão ou ações de inteligência nas favelas,
no momento que estiverem acontecendo ações sociais nesses locais. A decisão foi
tomada, na última sexta-feira. Serviços humanitários tem sido muito frequentes
nas comunidades, principalmente, durante a pandemia do novo coronavírus.
Na semana
passada, incursões policiais interromperam, pelo menos, duas doações de cestas
básicas, no Morro da Providência, na Zona Portuária do Rio, e na Cidade de
Deus, na Zona Oeste. Os confrontos entre agentes de segurança e traficantes
resultaram em duas mortes, entre elas, a de Rodrigo Cerqueira, de 19 anos, que
buscava os alimentos, quando foi baleado.
Na reunião,
Witzel pediu que as polícias ampliem o diálogo com lideranças comunitárias para
evitar que as operações sejam feitas nestes momentos de doações. Entretanto,
para a representante da Anistia Internacional, Jurema Werneck, a comunidade não
tem que contar para a polícia quando terá ação social, para evitar tiroteios
nessas ocasiões.
"Estamos
chamando atenção do governador para 17 mortes, em cinco comunidades, em uma
semana. A mensagem desta reunião era: ninguém está dizendo para a polícia parar
de trabalhar, mas que a polícia precisa trabalhar dentro da lei, respeitando o
direito à vida das pessoas. Nós não queremos que a comunidade tenha que
informar à polícia que vai fazer ação social, a comunidade tem sua vida própria
e tem seu direito de fazer suas ações. A gente quer que a polícia não ameace a
vida das pessoas", explica.
Alerj também
discutirá suspensão de operações durante a pandemia
A Comissão de
Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) havia marcado,
para esta segunda-feira, às 10h, uma discussão
sobre um projeto de lei que determina a suspensão de operações policiais nas
comunidades e periferias do Estado do Rio de Janeiro durante o
período de isolamento social.
A suspensão das
operações policiais se refere às ações táticas da política de segurança, não
abrangendo o atendimento à população em geral, por solicitação do serviço de
chamada ou registro de ocorrência. O projeto é de autoria da deputada estadual
Dani Monteiro (Psol).
"As ações
de solidariedade devem ser garantidas, pois são essenciais e são, basicamente,
a ajuda que chega às favelas e periferias. Mas precisamos garantir que os
moradores das comunidades não sejam aviltados hora nenhuma. De novo: a polícia
precisa operar com inteligência e todas as vidas têm de ser preservadas",
afirma a deputada.
Através da
assessoria de imprensa, a Polícia Civil informou que está de acordo com a
determinação do governador. Já a Polícia Militar reforçou que, durante a pandemia,
as lideranças comunitárias devem informar quando acontecerão ações sociais.
"Reforçamos a importância da aproximação com a sociedade e que seus
representantes informem aos batalhões de suas áreas, com certa antecedência,
sobre as ações sociais que serão promovidas, pois esse será um importante dado
a ser utilizado para o planejamento de nossas ações".
Grupos que
realizam ações sociais esperam que determinação de Witzel seja cumprida
Um dos grupos
sociais que se viu em meio ao tiroteio durante operação policial, enquanto
realizava distribuição de cestas básicas na última quarta, foi o projeto Frente
CDD. A expectativa, para eles, é de que o Estado cumpra a promessa de não
operar durante serviços comunitários.
"Na favela, tiroteios não são episódios cotidianos. O doloroso foi estar nessa situação cotidiana, no momento em que estávamos quebrando um isolamento em prol de outras vidas, para atender a fome das pessoas, que deveriam ser atendidas pelo Estado e não são. A grande inquietação é essa. Já que o Estado não consegue ou não quer atuar nas favelas em prol da fome, da falta de água, com saúde, com princípios básicos da vida, que pelo menos tenham o caráter para cumprir a própria fala", falou Victor Andrade, do Frente CDD.
Fundados da Central Única das Favelas (CUFA), Celso Athayde diz que a discussão não é o não combate ao crime, mas o momento para fazer isso.
"A gente entende que o governo, a polícia e a Justiça, devem combater o crime. O ponto é que nesse momento de pandemia, em que o governo tem tantas coisas a fazer, é preciso elencar prioridades. Como o tráfico sempre existiu e, em nenhum momento, a polícia conseguiu eficácia no combate a ponte de fechar, priorizar ataques às favelas nesse momento, parece que é algo sem propósito. O que me parece é que o saldo disso tem sido a morte de jovens. É coerente que ele repense a atuação da polícia nesses territórios, principalmente neste momento", finaliza.
"Na favela, tiroteios não são episódios cotidianos. O doloroso foi estar nessa situação cotidiana, no momento em que estávamos quebrando um isolamento em prol de outras vidas, para atender a fome das pessoas, que deveriam ser atendidas pelo Estado e não são. A grande inquietação é essa. Já que o Estado não consegue ou não quer atuar nas favelas em prol da fome, da falta de água, com saúde, com princípios básicos da vida, que pelo menos tenham o caráter para cumprir a própria fala", falou Victor Andrade, do Frente CDD.
Fundados da Central Única das Favelas (CUFA), Celso Athayde diz que a discussão não é o não combate ao crime, mas o momento para fazer isso.
"A gente entende que o governo, a polícia e a Justiça, devem combater o crime. O ponto é que nesse momento de pandemia, em que o governo tem tantas coisas a fazer, é preciso elencar prioridades. Como o tráfico sempre existiu e, em nenhum momento, a polícia conseguiu eficácia no combate a ponte de fechar, priorizar ataques às favelas nesse momento, parece que é algo sem propósito. O que me parece é que o saldo disso tem sido a morte de jovens. É coerente que ele repense a atuação da polícia nesses territórios, principalmente neste momento", finaliza.
Pandemia
pode ser momento de reavaliar políticas de segurança, segundo especialista
Um levantamento
sobre operações policiais realizadas no período da pandemia, feito pela Rede de
Observatórios da Segurança do Rio de Janeiro, apontou que, após o decreto de
medidas de isolamento social, em março, as incursões nas favelas diminuíram. No
entanto, essas ações voltaram a acontecer em abril e maio.
De acordo com
os dados do observatório, de 15 de março à 19 de maio, ocorreram 209 operações
com 69 pessoas mortas. Entre os dias 15 e 22 deste mês, houve 17 mortes durante
ações das polícias Civil e Militar, no estado.
"É
surpreendente que o governo do estado não tenha tomado antes uma decisão sobre
regulação e interrupção dessas operações. É mais chocante ainda o fato de que,
enquanto políticas públicas de outros setores estejam tentando minimizar o
sofrimento da população mais vulnerável durante a pandemia, policiais insistam
em fazer operações muito violentas, brutais, que deixam moradores acuados
durante os tiroteios e que ao mesmo tempo, produzem vítimas, algumas delas
inocentes. Já é tarde o gesto do governador, fazendo um primeiro sinal de
tentativa de controle. Não haver tiroteios durante ações sociais é o mínimo.
Durante a pandemia, é uma boa hora para a polícia mudar a sua forma de
ser.", declara Silvia Ramos, cientista social e coordenadora do Observatório
da Segurança.
O jornalista Rene Silva, do Voz das Comunidades, espera que após a reunião de Witzel com outras autoridades, as operações nas comunidades cessem.
O jornalista Rene Silva, do Voz das Comunidades, espera que após a reunião de Witzel com outras autoridades, as operações nas comunidades cessem.
"É
lamentável que o governador não tenha entendido o momento de pandemia que
estamos vivendo, pessoas passando fome, por que não levar ajuda aos mais
necessitadas agora ao invés de fazer operações policiais? Não ajudam e ainda
atrapalham quem está ajudando e fazendo alguma coisa", falou.
Por Thuany
Dossares
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