Carro de som do tráfico avisa toque de recolher na favela de Acari - Reprodução/RG Notícias |
Moradores da
favela de Acari, na Zona Norte do Rio, registraram em vídeo uma cena curiosa:
criminosos estão usando carro de som para anunciar toque de recolher, por conta
da pandemia. Vídeos e áudios de aproximadamente um minuto circulam nas redes
sociais com os avisos. O veículo 'fiscalizador' é chamado de'Carro da lapada' e
é um Civic prata com giroflex e caixas de som acopladas num reboque. Procurada,
a Polícia Civil não se posicionou até o fechamento desta edição.
"Atenção,
comunidade! Agora é lei. A ordem é ficar em casa. O carro da lapada vai passar
às 19h30. Não fique na rua batendo perna de bobeira. Atenção, mãe, não deixe suas
crianças nas ruas. Não estamos de férias. Estamos de quarentena", começa o
alerta precedido de um som de suspense.
Na sequência
diz que, durante o dia, se sair à rua, o uso da máscara é obrigatório. Festa e
churrasco só são permitidos dentro de casa, ainda de acordo com a ordem.
"O carro da lapada vai fiscalizar. O papo é toque de recolher. À noite só
será permitido quem trabalha com entrega e tem que estar de máscara e luva.
Isso é obrigatório", destaca."Repetindo, não estamos em colônia de
férias. Estamos em quarenta. Essa doença é séria. Já temos vários casos de
coronavírus dentro de Acari e alguns casos de morte. Não pague para ver. Abraça
o papo ou o papo vai te abraçar", finaliza.
Para José
Ricardo Bandeira, especialista em segurança pública, os áudios e vídeos são
lamentáveis. "O crime organizado está ocupando o lugar do poder público
devido à omissão. Já que o poder público não ocupa seus espaços, não incrementa
seus projetos sociais, o crime organizado ocupa esse lugar", avalia.
Bandeira diz que,
bem ou mal, o crime organizado está dentro da comunidade e vê a realidade
local. Para que infratores cheguem ao ponto de impor toque de recolher,
segundoe Bandeira, é porque criminosos estão vendo que a situação nas
comunidades está gravíssima. "As comunidades do Rio estão abandonadas. São
milhões de pessoas vivendo sem saneamento básico, sem condição mínima de
higiene. A proliferação de um vírus é catastrófica. Daí a preocupação do crime
organizado tentando conter. É algo ilegal, não podemos concordar que pessoas
vivam sob o julgo da violência, da pressão bélica, mas acontece devido à
omissão do poder público", diz.
"Não foi
feita nenhuma campanha de prevenção nas comunidades por parte das autoridades.
O poder público não fez distribuição de álcool em gel e sabonetes nas favelas.
Diante de tanta omissão, cria-se um terreno propício para o crime organizado
fazer o que fez. Quando ele impõe toque de recolher, demonstra preocupação
grande com a comunidade, já que ele (crime organizado) vive de exploração, venda
de drogas, serviços. Se impõe toque de recolher, diminuindo a arrecadação, é
porque a situação está muito grave", detalha José Ricardo.
A solução
imaginada pelo especialista está em ações sociais. Política de saúde pública,
saneamento, educação. "O poder público precisa, neste momento, de foco em
saúde, fazer campanha nas comunidades. O morador mal sabe o que fazer, precisa
de conscientização, de suprir os meios necessários. O governo deve distribuir
cartilhas, sabonete, álcool em gel. Já que não tem água, faça distribuição de
galões de água, kit de higiene para que a população possa se cuidar. Vivemos
uma situação em que a população com poder aquisitivo está em pânico, agora
imagina quem não tem dinheiro?", questiona Bandeira.
Por Gabriel
Sobreira
#RGnotícias— RG Notícias (@ComunidadesRJ) April 23, 2020
💢 Bandidos com consciência social no Acari.
Parece mentira, mas não é! pic.twitter.com/BleRH0tqAf
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