Chefe da
cardiointensiva do hospital avisa que não pode aceitar novos pacientes
Rio - O alerta
é assustador. Uma unidade inteira do Hospital Federal do Andaraí (HFA) entrou
em processo de extinção por falta de médicos. E não é qualquer setor. É a
unidade cardiointensiva, onde vítimas de males como infartos agudos no
miocárdio necessitam de cuidados urgentes para evitar as complicações
cardiovasculares que, quando não matam, deixam sequelas que comprometem a
qualidade de vida do infartado. Dos seis leitos da unidade, dois já estão
fechados. Restam quatro pacientes internados, que, segundo funcionários do HFA,
estão apenas aguardando transferência.
A previsão
sombria partiu de ninguém menos do que o próprio chefe da unidade
cardiointensiva do HFA, o médico Geraldo Ventura Chedid. Em e-mail encaminhado
à direção geral do hospital, Chedid conta que a falta de médicos tornou o
funcionamento da unidade insustentável. Ele explica que duas médicas entraram
de licença-maternidade e um outro cardiologista está se aposentando.
"Assim, visando minimizar o impacto de se chegar o dia no qual não haverá
plantonista, informo que os leitos que forem vagando a partir de hoje serão
fechados, evitando-se que, quando chegar este dia, ainda existam pacientes
internados", avisa Chedid, que mandou a mensagem na última terça-feira.
Procurado, o
Ministério da Saúde negou. Em nota, informou que "quatro profissionais do
processo seletivo de 2018 foram selecionados para atuarem imediatamente no
Serviço de Cardiologia da unidade, que conta com atendimento de alta
complexidade e leitos de terapia intensiva". E diz mais: "Além da
manutenção da força de trabalho já existente, o HFA recebe um reforço adicional
de 721 profissionais, convocados deste último processo seletivo, que estão
sendo distribuídos de acordo com as prioridades assistenciais da unidade".
O órgão, no entanto, não informa quando o reforço chega.
O caso chegou
ao conhecimento do Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj-RJ), cujo
presidente, o clínico Sylvio Provenzano, que chefiou a emergência do HFA
durante 13 anos, prometeu tomar providências. "O Hospital do Andaraí é uma
referência de bom atendimento na Zona Norte. Vamos solicitar a recolocação dos
médicos na unidade", garantiu Provenzano, que já marcou reunião com o
Departamento de Gestão Hospitalar (DGH), órgão responsável pela gestão dos seis
hospitais do Ministério da Saúde no Rio de Janeiro.
O que preocupa
médicos, apavora pacientes. Segundo a psicóloga Sonia Machado, 49, que foi ao
HFA fazer exame de tomografia, os comentários são de que outros setores também
podem ser fechados. "Nada deveria fechar ou deixar de existir em um
hospital. Enquanto as pessoas brigam por política essas coisas acontecem",
reclama. A dona Cecilia Maria da Conceição, 74, que mora em São João de Meriti
e luta contra um câncer no estômago, é vítima do desmonte do hospital. Ontem,
ela foi à toa ao HFA. "Eu tinha consulta marcada para 14h, mas não tem
médico", contou.
"Sinto que
sou lixo. Venho de longe, sentindo dor, para não ser atendida. Estou há um ano
esperando pela cirurgia e não tenho certeza se vou conseguir esperar
mais", lamentou dona Cecília, que depende da sobrinha Claudete Barros, 48,
para se locomover. Marcia Pinto, 55, está com a mãe de 79 anos no CTI do HFA
aguardando data pra cirurgia. Ela disse que questionou no hospital sobre o
fechamento da unidade e foi informada que o CTI geral deve assumir o serviço.
Poucos
médicos são contratados
"Está
havendo um descompasso entre a velocidade da contratação de médicos e a
realidade da Saúde". O diagnóstico é do presidente da Federação Nacional
dos Médicos (Fenam), Jorge Darze. Segundo ele, o Ministério da Saúde baixou uma
portaria, em março, autorizando a contratação de 3.592 profissionais de saúde,
dos quais 1.340 médicos para a rede de hospitais federais do Rio.
"Já
estamos em outubro e até agora o quantitativo não foi contratado. Embora alguns
poucos médicos tenham sido chamados, a grande maioria ainda precisa ser
contratada. Esta situação de penúria é conhecida há muito tempo", reclamou
o médico.
Segundo Darze,
muitos setores de hospitais federais se encontram em situação parecida com a
unidade cardiointensiva do Andaraí. "Estão agonizando!", denunciou o
presidente da Fenam, citando como exemplo a novíssima emergência do Hospital
Federal de Bonsucesso, inaugurada em fevereiro, mas que até hoje não funciona
plenamente por falta de profissionais. "Por que não fazem concurso para
suprir o déficit?" questionou.
Por WILSON AQUINO
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