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© Reuters Maduro
afirmou que a Venezuela é vítima de uma
conspiração: 'A Venezuela caminha com seus
próprios pés.
.. e nunca
ficará de joelhos'
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Na
quarta-feira, os governos da Argentina, Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e
Canadá pediram ao Tribunal Penal Internacional (TPI) que investigue suspostos
crimes contra a humanidade e abusos aos direitos humanos ocorridos na Venezuela desde
12 de abril de 2014 sob o governo de Nicolás Maduro.
Um dia depois,
na quinta-feira, aqueles países motivaram também a apresentação de uma
resolução no Conselho de Direitos Humanos da ONU que pedia a cooperação da
Venezuela nos esforços para aplacar a crise humanitária no país. Ela foi
aprovada por 23 países, incluindo o Brasil (outros 7 países foram contrários, e
17 se abstiveram).
Se votou pela
aprovação da resolução, por que, porém, o Brasil não se juntou ao grupo de
países que protagonizou estas ações - uma vez que é uma potencia regional e já
liderou iniciativas marcantes que questionaram o regime de Maduro?
"É difícil
precisar porque algo não aconteceu, deixou de acontecer. Mas uma das questões
que me permite imaginar esta ausência é que o Brasil parece estar adotando uma
postura menos frontal, de descompressão da animosidade. Estamos com um problema
sério na fronteira, que vem afetando o fornecimento de energia e o fluxo
migratório", aponta Leandro Consentino, especialista em relações internacionais
do Insper.
Consentino
exemplifica esta sinalização menos incisiva com o encontro, planejado para esta
sexta-feira, entre os ministros das Relações Exteriores do Brasil e da
Venezuela - Aloysio Nunes e Jorge Arreaza.
'Persona non
grata': o rompimento temporário das relações diplomáticas Brasil-Venezuela
A reunião
sucede um hiato de reuniões entre chanceleres desde que as relações
diplomáticas entre os dois países foram suspensas temporariamente em dezembro -
quando o embaixador brasileiro em Caracas foi expulso e tratado como
"persona non grata". O regime de Maduro justificou a decisão
comentando fatos da política interna brasileira, como o impeachment da
ex-presidente Dilma Rousseff.
Em relação à
crise humanitária e política da Venezuela, o Brasil protagonizou acusações
frequentes em plenárias da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Em 2016, o
Brasil, em conjunto com outros países, liderou a aprovação da suspensão da
Venezuela, por tempo indeterminado, do Mercosul. Um novo bloqueio do tipo foi
aprovado no bloco novamente em 2017.
Mas, em entrevista
exclusiva à BBC News Brasil em Nova York, Nunes optou por um tom moderado e
afirmou nesta quinta-feira que "não há hostilidade" entre os países.
"Temos
relações diplomáticas e não há razão para negar os encontros (como o com Jorge
Arreaza). Temos uma fronteira bastante extensa, uma comunidade brasileira importante
morando lá, três consulados, uma imigração sem uma dimensão dramática como a
que existe em direção a outros países", afirmou o chanceler brasileiro.
Consentino
aponta que a suspensão do Mercosul foi uma sinalização forte enviada pelo
Brasil, que no entanto pode estar agora apostando mais no diálogo.
"Hoje o
tom é mais brando. Talvez justamente para que a política não contamine as
trocas comerciais e outras negociações", aponta o pesquisador do Insper.
Oliver
Stuenkel, professor adjunto de Relações Internacionais na Fundação Getúlio
Vargas (FGV), concorda que o Brasil tem preferido o caminho do multilateralismo
em fóruns regionais em detrimento de ações como a que recorreu ao Tribunal
Penal Internacional.
"O Brasil
está no Grupo de Lima (organização criada em 2017 para buscar soluções para a
crise venezuelana) e tem condenado com frequência violações no país. A
estratégia tem sido como a de outros países da região, de condenar, nos fórus
internacionais, a ruptura democrática, mas sem impor sanções", aponta
Stuenkel.
"O mais
importante é que, apesar de todos estes avanços institucionais, a América
Latina não conseguiu impactar de maneira eficaz na situação venezuelana. Ao meu
ver, hoje, qualquer atuação será de natureza paliativa. Hoje não vejo ninguém
com capacidade de reiniciar um diálogo positivamente."
Uma fonte que
preferiu não se identificar apontou ainda que a diplomacia brasileira decidiu
não se juntar aos seis países que recorreram ao TPI por avaliar que, caso a
acusação contra Maduro avance no tribunal, uma condenação o impediria de sair
do país - sob o risco eventual de ser preso nos países signatários do Estatuto
de Roma, em que a corte tem jurisdição.
Assim, estaria
afastada uma solução para a crise venezuelana que pudesse envolver a remoção de
Maduro - algo conhecido como uma "saída honrosa".
Ineditismo em
Haia
O desenrolar no
TPI ainda é bastante incerto - afinal, nunca na história deste tribunal,
sediado em Haia, na Holanda, e fundado em 2002, representantes de Estados
membros pediram a abertura de um procedimento contra representantes de outro
país membro.
"A novidade
deste processo é que aqueles que fizeram a denúncia são chefes de Estado e de
governo. Os casos anteriores foram oriundos do trabalho de documentação feito
por organizações de direitos humanos, que levaram os resultados ao
tribunal", explica Juan Navarrete, ex-representante do Instituto
Interamericano de Direitos Humanos na Colômbia em conversa com a BBC News
Mundo, serviço em espanhol da BBC.
O especialista
enfatiza que, diferentemente dos casos que são processados por outras
organizações, como a Corte Interamericana de Direitos Humanos, nos julgamentos
perante o TPI a responsabilidade não é do Estado, mas individual. A acusação
apresentada no TPI recai sobre 11 pessoas, incluindo Maduro e membros das
Forças Armadas.
"Embora se
fale da denúncia contra a Venezuela, não se trata de uma ação contra o Estado
venezuelano, mas contra as pessoas denunciadas por violações dos direitos
humanos e crimes contra a humanidade. Embora mencione Maduro, a investigação
sempre afeta toda uma cadeia de comando que tornou esses eventos
possíveis", acresenta Navarrete.
O pedido de
investigação contra a Venezuela se baseia, entre outros elementos, em três
relatórios sobre violações de direitos humanos naquele país preparados pela
ONU, a Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Comissão Interamericana de
Direitos Humanos (CIDH).
Segundo
Fernando Fernández, professor de Direito Penal Internacional da Universidade
Central da Venezuela, procedimentos no TPI podem durar anos. Isto depende, em
parte, da colaboração dos envolvidos.
Fernandéz
lembra do caso do presidente do Sudão, Omar al-Bashir.
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© AFP 'Temos
relações diplomáticas e não há razão para negar
os encontros', disse o chanceler Aloysio Nunes
à BBC News Brasil
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Em 2008, a
Procuradoria do TPI acusou o líder sudanês por crimes de guerra cometidos na
região de Darfur.
Al-Bashir
tornou-se assim o primeiro chefe de Estado em exercício a ser imputado por essa
instância.
O governo
sudanês rejeitou as acusações e não quis colaborar com o processo, para o qual
al-Bashir ainda não pôde ser julgado.
Isso, no
entanto, não o impediu de viver alguns percalços. O TPI emitiu contra ele dois
mandados de prisão, em 2009 e 2010, dificultando viagens para o exterior.
Em 2015, por
exemplo, al-Bashir teve que sair às pressas da África do Sul, onde participava
de uma cúpula da União Africana. Ele escapava da ordem de um juiz local, que
acatou a ordem de prisão expedida pelo TPI.
Os
representantes do tribunal afirmam que todos os signatários do Estatuto de
Roma, que o estabeleceu, são obrigados a cumprir suas ordens.
Até agora, o
presidente sudanês escapou da captura e continuou a viajar, sobretudo na África
e na Ásia. No entanto, não pisou nos Estados Unidos, na Europa Ocidental e em
outros países onde o risco de ser detido é maior.
Assembleia
Geral da ONU discute a Venezuela
Também na
Assembleia Geral da ONU, a crise na Venezuela esteve na pauta esta semana.
O presidente
dos EUA, Donald Trump, anunciou a imposição de novas sanções contra o país
sul-americano e falou que o regime de Maduro poderia ser "muito
rapidamente" derrubado por seus próprios militares caso estes decidissem
agir assim.
"Hoje, o
socialismo levou uma nação rica em petróleo à falência e levou a sua população
à pobreza extrema", disse Trump. "Pedimos às nações reunidas aqui
hoje que clamem pela restauração da democracia na Venezuela".
Em uma aparição
"surpresa", Maduro por sua vez falou na ONU que seu governo é vítima
de uma conspiração internacional.
"As
oligarquias do continente - e aqueles que a comandam desde Washington - querem
o controle político da Venezuela", afirmou o venezuelano. "A
Venezuela caminha com seus próprios pés... e nunca ficará de joelhos".
Já o presidente
do Brasil, Michel Temer, criticou medidas isolacionistas entre países e citou a
Venezuela, sem, no entanto, citar diretamente a condução política do país. O
presidente mencionou o compromisso brasileiro com as instituições democráticas
e os direitos humanos.
"Estima-se
em mais de um milhão os venezuelanos que já deixaram seu país em busca de
condições dignas de vida. O Brasil tem recebido todos os que chegam a nosso
território. São dezenas de milhares de venezuelanos a quem procuramos dar toda
a assistência", disse Temer.
"Sabemos
que a solução para a crise apenas virá quando a Venezuela reencontrar o caminho
do desenvolvimento."
*Com
informações de Ángel Bermúdez, da BBC News Mundo; colaborou Ingrid Fagundez, da
BBC News Brasil em São Paulo
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