O presidente
da Venezuela, Nicolás Maduro, vota durante
eleições
municipais, em Caracas, no último dia 10
(Foto:
HO/Venezuelan Presidency/AFP)
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A expulsão
do embaixador brasileiro é mais um passo no plano de Nicolás Maduro para
consolidar sua ditadura
Entre a
hiperinflação e a disparada da mortalidade infantil, o governo venezuelano
ainda encontrou tempo para declarar “persona non grata” o embaixador brasileiro
em Caracas, Ruy Pereira. Em retaliação, o Itamaraty tomou ontem a mesma medida
em relação ao encarregado de negócios venezuelano, Gerardo Delgado.
Delgado é o
mais alto diplomata na Venezuela no Brasil desde o ano passado, quando o
governo do ditador Nicolás Maduro decidiu retirar daqui seu embaixador, em
protesto contra o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.
A expulsão dos
diplomatas está um passo aquém da ruptura de relações. É uma marca da inflexão
na política brasileira em relação ao país vizinho no governo do presidente
Michel Temer, depois dos anos de apoio ao chavismo nas gestões petistas –
mudança bem-vinda, ainda que tardia.
A necessidade
de enfrentamento demonstra o fracasso da estratégia de distanciamento, diante
do avanço progressivo da ditadura de Maduro. Tomada em nome dos interesses de
negócios brasileiros na Venezuela (eles não são poucos) e da estabilidade da
fronteira amazônica, tal estratégia se revelou ingênua diante do descalabro no
país vizinho.
A situação
venezuelana hoje é de crise humanitária e uma ameaça a estabilidade regional. A
previsão do FMI é que a inflação feche 2017 em 653% e chegue a quatro dígitos
no ano que vem. O PIB deverá cair 12% este ano, depois de encolher 16,5% e 6,2%
nos dois últimos. Pela primeira vez desde 1995, as reservas internacionais
estão abaixo de US$ 10 bilhões. O calote externo é mais que provável.
A indústria
está parada (pouco mais de mil carros saíram em 2017 das montadoras). No
comércio, prateleiras vazias e saques são a regra. A violência é endêmica. A
mortalidade infantil subiu de 4.767 mortes, em 2007, para 7.630 ,em 2014,
quando o governo deixou de informar números oficiais (em 2016, foram apuradas
11.466 mortes). Fome e miséria crescem, sem perspectiva de solução.
Com a expulsão
dos embaixadores do Brasil e do Canadá, Maduro tenta desviar o foco de seus
problemas reais. Não apenas econômicos, mas sobretudo políticos. Em tese, 2018
é ano de eleições presidenciais. Maduro tem a esperança de usar a oportunidade
para sufocar a oposição e consolidar seu poder.
Seu plano vem
sendo executado à risca. Em julho, foi eleita uma Assembleia Constituinte
fajuta, em que o governo obteve ampla maioria graças a regras eleitorais
favoráveis. Nas eleições regionais de outubro, a manipulação da votação
garantiu aos governistas 18 das 23 províncias.
As eleições
municipais do último dia 10, as primeiras desde a morte de Hugo Chávez, foram
boicotadas pela oposição. Com baixa participação (47,3%, segundo a Comissão
Eleitoral; 30%, segundo observadores), os governistas afirmaram ter conquistado
308 das 335 prefeituras.
Os resultados
oficiais finais ainda não foram publicados. Nesse meio tempo, a Constituinte
dissolveu os governos municipais de Caracas e Alto Apure, únicos para os quais
não houve eleição. O último prefeito eleito de Caracas, o oposicionista Antonio
Ledezma, foi obrigado a fugir do país, em virtude da persegução do governo
Maduro.
Em nota, o
Itamaraty protestou contra a dissolução das prefeituras. “São medidas que
desmentem o anunciado interesse do governo venezuelano em buscar uma solução
negociada e duradoura para a crise”, diz a nota. Diante da tragédia
venezuelana, o balé diplomático não surte efeito.
Se Maduro
convocar mesmo as eleições previstas em 2018, a tensão é inevitável. A oposição
saiu enfraquecida e dividida das eleições regionais e municipais. Vários
líderes estão presos. A imprensa livre foi sufocada. Maduro aposta no caos e
nos bodes expiatórios (como o Brasil) para vencer sem precisar recorrer à
fraude disseminada. Mas não há dúvida de que recorrerá se preciso. É o que
ditadores sempre fazem.
Por Helio Gurovitz
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