A maioria dos ministros entendeu que o STF pode impor as chamadas medidas cautelares aos parlamentares, mas que a decisão será remetida em até 24 horas para Câmara ou Senado |
Decisão pode
influenciar caso do senador Aécio Neves (PSDB-MG). No fim de setembro, a
Primeira Turma do STF – composta por 5 dos 11 ministros – determinou o
afastamento de Aécio do mandato.
O Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (11) dar ao Legistativo a
palavra final sobre a suspensão do mandato de parlamentares pelo Judiciário.
Por esse
entendimento, decisões do STF de afastar deputados e senadores de suas funções
só podem se efetivar com aval da Câmara ou do Senado.
A maioria dos
ministros entendeu que o STF pode impor as chamadas medidas cautelares aos
parlamentares, mas que a decisão será remetida em até 24 horas para Câmara ou
Senado na hipótese de a medida cautelar impossibilitar, direta ou
indiretamente, o exercício regular do mandato.
A decisão sobre
quais dessas medidas serão submetidas ao Congresso será do próprio STF, caso a
caso. Ao receberem uma medida cautelar do STF, deputados ou senadores
decidirão, pelo voto da maioria de seus membros, sobre a aplicação da medida.
Algumas das
medidas cautelares que o Judiciário pode determinar são
- afastamento do mandato;
- recolhimento noturno domiciliar;
- proibição de o parlamentar ter contato com
determinadas pessoas;
- impedir que ele deixe o país;
- proibição de frequentar determinados lugares.
Mas, se tais
medidas impossibilitarem o exercício regular do mandato, serão submetidas à
decisão final do Legislativo.
O julgamento
Na sessão desta
quarta-feira, o STF examinou ação apresentada em maio do ano passado, quando o
tribunal afastou do mandato o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ).
Na ação, os
partidos PP, PSC e SD propuseram que medidas do tipo sejam submetidas em até 24
horas ao Congresso para decisão final. Trata-se do mesmo procedimento adotado
na prisão de parlamentares, só possível em caso de flagrante em crime
inafiançável.
O julgamento
durou todo o dia, e à noite chegou a um empate, com 5 ministros defendendo a
impossibilidade de aplicação de medidas cautelares ou sua submissão ao
Congresso e 5 se posicionando a favor da aplicação das medidas sem necessidade
de aval do Legislativo.
A solução foi
construída ao final do julgamento, após o voto da presidente da Corte, Cármen
Lúcia.
Ela acolheu
sugestão do ministro Celso de Mello de submeter ao Congresso todas as decisões
do STF sobre parlamentares que impossibilitem – direta ou indiretamente – o
regular exercício do mandato.
A decisão
tomada pelo plenário do Supremo poderá influenciar o caso do senador Aécio
Neves (PSDB-MG). No fim de setembro, a Primeira Turma do STF – composta por 5
dos 11 ministros – determinou o
afastamento de Aécio do mandato. A decisão da turma do STF havia
provocado reações no Senado, que marcou para o próximo dia 17 uma votação em
plenário a fim de analisar a
decisão do Supremo.
A suspensão das
funções parlamentares é uma das medidas previstas no Código de Processo Penal
(CPP) que substituem a prisão preventiva (decretada antes do julgamento sobre a
culpa da pessoa e usada, em geral, a fim de evitar que ela use o cargo para
atrapalhar investigações em andamento).
No julgamento
desta quarta, prevaleceu a tese em favor da “independência entre os poderes” e
da “imunidade parlamentar”. Esses princípios da Constituição buscam evitar
interferência indevida do Judiciário sobre o Legislativo e proteger deputados e
senadores, pela condição de representantes políticos eleitos.
Defesa de
Aécio
Ao final do
julgamento, um dos advogados de Aécio, José Eduardo Alckmin, disse que, na
avaliação dele, “todas as medidas que interfiram no exercício do mandato, de
forma direta ou indireta, devem ser comunicadas ao Senado para a deliberação”.
Para ele, a
decisão desta quarta-feira pode vir a beneficiar o senador tucano. “Pode
beneficiar na medida em que o Senado tem o direito de se pronunciar, mas, claro
que temos que aguardar o pronunciamento do Senado”, declarou.
COMO VOTARAM
OS MINISTROS
AFASTAMENTO
COM AVAL DO CONGRESSO
|
AFASTAMENTO
SEM AVAL DO CONGRESSO
|
ALEXANDRE DE
MORAES
|
EDSON FACHIN
|
DIAS TOFFOLI
|
LUÍS ROBERTO
BARROSO
|
RICARDO
LEWANDOWSKI
|
ROSA WEBER
|
GILMAR MENDES
|
LUIZ FUX
|
MARCO AURÉLIO
MELLO
|
CELSO DE
MELLO
|
CÁRMEN LÚCIA
|
Fonte: Supremo
Tribunal Federal
Veja abaixo os
argumentos dos votos dos ministros no julgamento:
Luiz Edson
Fachin
Primeiro a
votar, Fachin se manifestou contra a necessidade de aval do Congresso para
afastamento, levando em conta, sobretudo o princípio da isonomia de todas as
pessoas perante a lei e o princípio republicano, que impede tratamento
privilegiado às autoridades.
"Uma vez
que a imunidade, referente ao cargo e àqueles que o detêm, não pode ser
confundida em nenhum momento com impunidade ou a possibilidade de vir a sê-lo,
afinal, a imunidade é uma garantia, porque a República não comporta
privilégios. Até por que, privilégio é incompatível com a República",
afirmou o ministro.
Relator da ação,
o ministro também disse que as imunidades previstas na Constituição para
parlamentares – entre as quais, a possibilidade de o Congresso rever uma prisão
– devem ser interpretadas de forma restrita, não podendo ser estendidas para
outras hipóteses.
"Essa
regra não confere nem de longe ao Poder Legislativo o poder de revisar juízos
técnicos jurídicos emanados pelo Poder Judiciário. Ao Poder Legislativo, a
Constituição outorgou o poder de relaxar a prisão em flagrante, forte no juízo
político. Estender essa competência para permitir a revisão, por parte do Poder
Legislativo, das decisões jurisdicionais sobre medidas cautelares penais
significa ampliar a imunidade para além dos limites da própria normatividade
enredada pela Constituição. É uma ofensa ao postulado republicano e é uma
ofensa à independência do Poder Judiciário”, afirmou o ministro no voto.
Alexandre de
Moraes
Segundo a falar
no julgamento, Alexandre de Moraes votou contra a possibilidade de
afastamento de parlamentares. Mas, ao final do voto, ressalvou que, se a
maioria entendesse que é possível afastar um parlamentar, ele se alinharia aos
que se posicionaram a favor de submeter a decisão à Câmara ou ao Senado.
Moraes
argumentou que, pela Constituição, a única hipótese de interferência do Judiciário
no mandato ocorre quando o parlamentar é preso em flagrante por crime
inafiançável; mesmo nessa situação, ressaltou o ministro, o Congresso pode
rever a medida.
“Essa cassação
cautelar, esse afastamento de mandatos populares, seria uma violência, a meu
ver, é uma violência muito séria ao equilíbrio entre estado de direito, a
jurisdição constitucional e a própria democracia, sem que se aguarde o devido
processo legal e a condenação final”, afirmou o ministro.
No início de
seu voto, Moraes negou que tal posição signifique “privilégios hediondos” e
“favorecimentos pessoais” a parlamentares suspeitos de corrupção. Ele enfatizou
a necessidade de preservação das “imunidades parlamentares”, proteção especial
conferida a deputados e senadores pela condição de representantes eleitos.
Luís Roberto
Barroso
Barroso
acompanhou Fachin lembrando que até o STF já havia determinado por duas vezes o
afastamento de parlamentares sem necessidade de submeter a decisão ao
Congresso.
Ele disse que o
atual momento vivido pelo país exige uma interpretação da Constituição mais
rígida em relação aos parlamentares.
“A ideia de que
o Poder Judiciário não possa exercer o seu poder cautelar para impedir que o
cometimento de um crime que esteja em curso? É a negação do Estado de direito.
Significa dizer que o crime é permitido para algumas pessoas. Eu não gostaria
de viver num país que fosse assim”, afirmou o ministro.
Ele disse que
as medidas alternativas, como o afastamento e mesmo o recolhimento noturno, não
equivalem à prisão de parlamentares, que precisa ser autorizada pelo
Legislativo.
“Prisão não é
porque não interfere com a rotina da vida da pessoa, a rotina funcional de
trabalho durante o dia, a rotina da vida da pessoa não é afetada. [...] O que
se impede com o recolhimento domiciliar noturno é que se frequente balada,
restaurantes, recepções, eventos festivos”, afirmou o ministro.
Rosa Weber
Quarta a votar,
a ministra Rosa Weber acompanhou o voto do relator Edson Fachin. Para a
magistrada, não há necessidade do aval do Congresso em relação
a medidas cautelares impostas pelo STF a parlamentares.
A ministra
sustentou que o afastamento do mandato e o recolhimento domiciliar noturno são
medidas diversas da prisão, conforme previsto no Código de Processo Penal.
Ela afirmou
também que submeter a decisão do STF à votação do Congresso significaria
“corromper” o equilíbrio entre os Poderes.
“A Constituição
em dispositivo algum submete à confirmação do Poder Legislativo a aplicação de
medida cautelar diversa da prisão”, declarou Rosa.
“Submeter ato
que é próprio do Poder Judiciário ao escrutínio de outro poder, no caso o
Legislativo – à revelia de comando constitucional neste sentido, porque com
prisão [a medida cautelar] não se confunde e, portanto, não há a incidência do
artigo 53 da Carta – isso sim implicaria corromper o equilíbrio do delicado
sistema de separação entre os Poderes”, finalizou.
Luiz Fux
Ao votar contra
a necessidade de aval do Congresso, Fux disse que o STF não pode “inferir”
novos “privilégios” para os parlamentares, que, segundo, devem estar
“explicitamente consagrados” na Constituição.
O ministro
disse que a proteção dada a eles serve para preservar a democracia, não para
garantir a impunidade.
“A Constituição
ela não diferencia o parlamentar para privilegiá-lo. Distingue-o e o torna
imune ao processo para que os princípios do estado democrático sejam cumpridos,
jamais para que eles sejam desvirtuados, afinal o que se garante é a imunidade
e não a impunidade. Essa é incompatível com a democracia, com a república e com
o próprio princípio do estado de direito”, afirmou.
Fux lembrou que
as medidas alternativas à prisão são decretadas na fase investigatória, antes,
portanto, da acusação formal e da abertura de ação penal, na qual o político
responde como réu.
“Entre o
inquérito policial e a ação penal já um grande decurso de tempo. Quem é que vai
atuar nesse vácuo, quem é que vai atuar nesse interregno? É o Poder Judiciário.
Ninguém está sendo pego de surpresa”, disse.
Dias Toffoli
Em seu voto, o
ministro Dias Toffoli defendeu que o afastamento seja sempre submetido,
em até 24 horas, à decisão final do Congresso.
Além disso,
propôs requisitos mais rigorosos para a medida, que só poderia ser determinada
pelo STF se o parlamentar for flagrado cometendo crime inafiançável – mesma
hipótese na qual a prisão é permitida – ou então em “situações de superlativa
excepcionalidade”.
O mesmo valeria
para o recolhimento noturno, outra medida alternativa à prisão preventiva. Para
Toffoli, a permanência em casa à noite também deve ser ratificada pela Câmara
ou Senado porque “cria embaraços ao livre exercício” do mandato.
Toffoli disse
que a solução harmoniza a independência dos poderes com a efetividade da
investigação. “A relação independente e harmoniosa entre os poderes do Estado
exige que essa atuação se dê, como exposto, 'sem predomínio'. Nem passivismo
nem ativismo exacerbado. No exercício do seu papel moderador, incumbe ao
Supremo Tribunal Federal distensionar as fricções que possam ocorrer entre os
demais Poderes constituídos”, afirmou o ministro.
Ricardo
Lewandowski
O ministro
Ricardo Lewandowski também disse que o afastamento de parlamentares só
é possível com autorização do Congresso.
Para ele, assim
como no caso de prisão em flagrante, deve ser dada à Câmara ou ao Senado a
“avaliação política” sobre a suspensão do mandato.
O ministro, no
entanto, alertou para decisões do Congresso que contrariem a moralidade.
“É
desnecessário lembrar que decisões parlamentares que sejam inspiradas por
sentimentos meramente corporativos ou que deixem de observar o princípio da
moralidade certamente serão recebidas com enorme perplexidade pela sociedade”,
afirmou.
Gilmar
Mendes
O ministro
Gilmar Mendes inicialmente opinou pela impossibilidade de o STF afastar
parlamentares ou aplicar outra medida restritiva. Posteriormente,
durante o julgamento, mudou o voto, para admitir que a execução dessas medidas
dependeria de autorização do Congresso.
Durante seu
voto, o ministro também ressaltou a importância de preservar a harmonia entre
os poderes Judiciário e Legislativo. Alertou os colegas para a possibilidade de
uma “escalada de conflito de poderes” caso o Supremo determinasse afastamento
sem aval do Legislativo.
“Se nós nos
permitirmos a aplicação naquilo que envolve a atividade parlamentar, nós vamos
permitir certamente a aplicação da prisão provisória”, afirmou o ministro.
Marco
Aurélio Mello
Voto vencido na
sessão da Primeira Turma do STF que afastou Aécio Neves do mandato, o ministro
Marco Aurélio Mello se declarou contrário à aplicação a parlamentares
de qualquer medida alternativa à prisão, como o recolhimento noturno
domiciliar, também aplicada ao senador.
Marco Aurélio,
no entanto, fez uma ressalva em seu voto, afirmando que, caso a medida seja
aplicada – apesar de ele ser contra –, deverá haver uma submissão da medida à
Casa legislativa do parlamentar em questão.
Marco Aurélio
foi o nono magistrado a proferir voto no julgamento desta quarta.
Celso de
Mello
Em seu voto,
Celso de Mello defendeu a possibilidade de afastamento de parlamentares sem
necessidade de aval do Congresso.
Ele enfatizou o
poder do Supremo para aplicar as medidas necessárias à investigação,
ressalvando que elas não representam uma punição nem um juízo de culpa sobre o
parlamentar. Depois, reforçou a posição da Corte de ter a última palavra no
caso.
“Nada impede
que se discuta a decisão, que se debata o acerto ou não de um julgamento, mas
quem tem o monopólio da última palavra, sob a interpretação da Constituição, em
nosso modelo jurídico, desde sempre tem sido o Supremo Tribunal Federal”,
afirmou Celso de Mello.
Cármen Lúcia
Última a votar,
a presidente do STF se posicionou a favor da aplicação de medidas
cautelares contra parlamentares, mas também declarou ser necessário o aval da
Casa Legislativa quando a medida cautelar envolver o comprometimento do
mandato, citando o afastamento.
“Entendo que as
[medidas] são aplicáveis, haverão de ser aplicáveis, incluindo afastamento da
função, mas a diferença diz respeito à circunstância de que analisando essa
norma e considerado que o mandato não é de uma pessoa, mas de um eleitorado, é
que considero que o julgador deverá adotar qualquer das medidas previstas no
artigo 319”, disse.
“Mas, no ponto
específico que se refere ao exercício do mandato, como é o afastamento, tenho
para mim que, neste caso, o magistrado deverá encaminhar ao órgão competente”,
completou.
Por Renan Ramalho e Gustavo Garcia, G1,
Brasília
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