Núcleo de
Reportagens Investigativas simulou
participar
do jogo Record TV
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O rapaz foi identificado e passou
a ser investigado pela Polícia Civil fluminense após meses de investigações
jornalísticas do Núcleo de Reportagens Investigativas da Record TV. É a
primeira prisão de alguém envolvido diretamente na curadoria do Baleia Azul
ocorrida no País.
A equipe de jornalistas da Record
TV se infiltrou em comunidades restritas e chegou até um administrador do jogo
se fazendo passar por uma pessoa adepta aos desafios.
Depois de fingir cumprir as
ordens, uma vez por dia, a produção conseguiu se encontrar com o moderador. Sem
desconfiar que a conversa era gravada, o rapaz falou sobre o jogo Baleia Azul e
contou à suposta vítima, uma produtora da Record TV, porque queria levar os
jovens a cometer o suicídio.
A reportagem que identificou o
primeiro moderador do jogo Baleia Azul no Brasil foi exibida pelo Jornal da
Record em 31 de maio deste ano. Ela fez parte de uma série especial sobre
suicídio.
Ao ser preso na manhã desta
terça-feira, “Calango”, que era como o moderador pedia para ser chamado durante
os desafios do jogo Baleia Azul, afirmou à Polícia Civil fluminense ter sido
curador de ao menos 30 jovens.
Todos os casos serão investigados
pela polícia, que tentará descobrir se alguma delas foi efetivamente induzida
ao suicídio pelo rapaz.
“Em 30 anos de profissão, eu havia conhecido
apenas um psicopata. Este é o segundo”. A frase, que ressoou como um tambor
dentro da pequena sala onde as reportagens são editadas, foi dita pelo delegado
José Mariano de Araújo Filho, da Delegacia de Investigações sobre Crimes
Cometidos por Meios Eletrônicos, do Deic (Departamento Estadual de
Investigações Criminais). Desse momento em diante, o Núcleo de Investigações
Jornalísticas da Record TV teve a certeza de que o desafio da Baleia Azul
transcendeu os limites de uma suposta brincadeira na internet.
No mês de abril, o Núcleo
mergulhou no oceano das redes sociais a fim de encontrar “curadores” imersos no
jogo mortal (veja abaixo reportagem que foi ao ar nesta quarta-feira no
Jornal da Record). Com um perfil falso no Facebook e no aplicativo
WhatsApp, a equipe de jornalistas se passou por uma jovem de 19 anos, bonita,
dona de uma personalidade frágil e que procurava um sentido na vida, o
suicídio. Uma “isca”.
Durante o processo de busca na
internet, entramos em grupos do Baleia Azul à procura de termos que faziam
menção aos desafios mortais. Navegamos, adicionamos usuários no Facebook e
trocamos mensagens com eles, até encontrar um “curador” — figura responsável
por passar os 50 desafios que levam os seguidores, chamados de “baleias”, a
tirar a vida. Em síntese, Baleia Azul é um conjunto de tarefas diárias a serem
cumpridas — até que se atinja o objetivo final, o suicídio.
Primeiro contato
No primeiro contato com o curador,
surgiu a pergunta: “quer jogar?”. Respondemos “sim, muito”. Após questionar os
motivos, o curador também quis saber se a nossa personagem tinha algum problema
de saúde.
No mesmo dia, o predador passou a
primeira das 50 tarefas — que não serão descritas pela nossa reportagem por
orientação da psicóloga Alexandrina Meleiro, coordenadora da Comissão de Estudo
e Prevenção ao Suicídio da ABP (Associação Brasileira de Psiquiatria).
Nesse ponto, a investigação se
tornou também um desafio técnico. Descobrir a identidade do nosso interlocutor
foi o primeiro problema enfrentado, pois ele utilizava um nome falso, pedia
para ser chamado de “Calango”, e só mantinha conversas escritas por um
aplicativo de celular pré-pago, sem cadastro nas companhias telefônicas.
Apresentar as automutilações a
pedido de “Calango” foi outra barreira. O obstáculo foi superado por
maquiadores profissionais, que criaram cicatrizes falsas para levar o “curador”
a acreditar no cumprimento das tarefas.
Curador
localizado pela equipe de investigação
da Record TV Reprodução
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Mantivemos o diálogo durante um
mês, até marcamos um encontro no Rio de Janeiro. Mais uma vez, outro obstáculo.
Gravar o encontro sem ele suspeitar que era monitorado levou nossa equipe a
investir quatro dias na busca de um local adequado e seguro para elaborar um
complexo esquema de gravação, usando várias câmeras ocultas, algumas das quais
nas roupas da jornalista.
Por último, para que ele não
questionasse a ausência de cicatrizes nas mãos e braços da personagem,
enfaixamos as regiões das falsas mutilações com um tipo especial de esparadrapo
da cor da pele.
Um especialista em segurança
acompanhou o encontro, sempre mantendo uma distância prudente.
O Encontro
Minutos antes, ele havia enviado
uma mensagem para avisar que chegaria logo. No quarto do hotel, especialmente
alugado para esse fim, nossa produtora checava as câmeras e tentava conter a
ansiedade natural e provocada pela situação antes de descer ao local combinado.
“Calango” atravessou o portão do
hotel com andar firme, sem chamar a atenção dos seguranças. Subiu as escadas
até o primeiro andar e, de imediato, localizou a nossa produtora, que o
aguardava sentada à mesa no meio do restaurante.
Alto, com boa complexão física,
“Calango” tem 23 anos, mora em Nova Iguaçu, região metropolitana do Rio de
Janeiro, e se apresenta como um pedreiro que aspira estudar engenharia.
Até aquele momento, só tínhamos
uma foto enviada por ele via WhatsApp, mas não havia nenhuma certeza de que o
jovem por trás do celular fosse realmente o homem da fotografia, o que se
confirmou com sua chegada.
O encontro foi marcado inicialmente
para as 15h de uma sexta-feira. Porém, na noite anterior, ele informou ter
conseguido um trabalho de última hora, então só estaria livre no fim do dia
previsto para a conversa. Mesmo preocupados com a iluminação, ambiente e rotina
do local — tudo havia sido rigorosamente analisado para que a gravação
ocorresse sem problemas — concordamos em mudar para o fim da tarde.
“Calango” chegou pontualmente ao
encontro, remarcado para as 17h30 no restaurante de um hotel de alto padrão no
centro da capital fluminense. Vestia roupas simples, moletom, touca e chinelos.
Ele não se intimidou ao passar pela recepção do hotel nem ao entrar ao
restaurante, ainda vazio, onde nossa produtora e os demais membros da equipe
estavam apostos em outras mesas.
A conduta de “Calango” demonstrou
frieza e domínio da situação.
O encontro começou com um simples
“oi”, sem contato físico algum, beijo ou tapinhas nas costas. Sequer um aperto
de mãos. Sentou-se de frente para ela. Nossa produtora tomou a iniciativa e
disse o quanto estava chateada por não ter concluído os desafios. O resultado
foi o esperado. Menos de um minuto depois, “Calango” alardeava ter cumprido
todas as etapas do desafio e ter sobrevivido após um período de coma profundo.
Pouco perguntava sobre a vida da
nossa produtora e evidenciava prazer em ser o personagem central. Logo explicou
em detalhes, às vezes um pouco confusos, as dúvidas colocadas pela jornalista.
Mostrando domínio na arte de
seduzir presas vulneráveis, “Calango” mantinha uma linguagem corporal
tranquila, movimentos suaves e olhar direto, sempre no intuito de ocultar um
espirito sádico — embora travestido de serenidade.
“Calango” se mostrou especialista
no tema Baleia Azul. Falou sobre a origem russa do game, surgido em uma rede
social do leste europeu equivalente ao Facebook. Explicou como se tornou
“curador” e os motivos pelos quais se interessa por mutilações. “Eu gosto de
ver as pessoas sofrerem”. Ao contar histórias fantasiosas sobre seitas e
rituais, o prazer do jovem pelo sofrimento alheio era bastante óbvio.
Durante a conversa, também ficou
evidente que não havia nenhum interesse de caráter sexual da parte dele. Não
buscava o prazer pelo sexo, buscava o prazer pela dor, pelo ato de dominar e
provocar sofrimento. Pelo sadismo de observar a dor da vítima.
O encontro terminou do mesmo modo
que começou, sem nenhum contato físico, mas com a sensação do protagonista ter
deixado o local levando consigo boa parte das energias do time de jornalistas.
Nota
As informações coletadas durante a
produção da reportagem foram acompanhadas e receberam consultoria profissional
da área de saúde mental, especializadas no tema. Também foram encaminhadas à
Polícia Civil as informações sobre o encontro com “Calango” e todas as
informações pessoais do “curador”, como nome completo, endereço e idade, para
que as devidas providências sejam tomadas contra o crime de incitação ao
suicídio.
Da Record TV
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