A
substância, que ficou conhecida no Brasil como "pílula do câncer",
está sendo
produzida na Flórida (EUA) e será comercializada como
suplemento
em março (Divulgação)
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Dois ex-colaboradores do químico
paulista Gilberto Chierice anunciaram a venda
A fosfoetanolamina,
substância popularmente conhecida como ‘pílula do câncer’, deverá ser
lançada em março no país na forma de suplemento alimentar. O anúncio foi feito
pela internet no fim da semana passada pelo biólogo Marcos Vinícius de Almeida
e pelo médico Renato Meneguelo, que faziam parte do grupo de pesquisa do
químico Gilberto Chierice, o criador da fórmula.
“A fosfoetanolamina como
suplemento pode atrapalhar a pesquisa que está em curso. Vai tirar a
credibilidade dela como um remédio potencial para tratar o câncer”, disse
o químico Salvador Claro Neto, um dos principais parceiros de Chierice. “Ela
vai virar cogumelo do sol. Qual médico receita isso?”, questiona. Para Neto, a
venda como suplemento pode “queimar duas décadas de estudos sobre a
substância”. Apesar de discordar da postura dos ex-colegas, o químico disse que
não houve briga. “Foi só uma questão de ponto de vista”.
Atualmente, o composto é fabricado
pelo laboratório PDT Pharma, em Cravinhos, para a realização de um estudo
coordenado pelo o Instituto do Câncer de São Paulo, o Icesp. A primeira fase,
que envolveu 10 pacientes, já terminou e mostrou que a fosfoetanolamina é, pelo
menos, segura. Desde outubro, o estudo seguiu para a fase 2, quando sua
eficácia será testada em 200 doentes. Ao todo, o processo pode levar dois anos
para que, enfim, seja possível determinar se a fosfoetanolamina realmente
funciona.
EUA
A substância está sendo produzida
na Flórida (EUA) e será comercializada via e-commerce para o resto do mundo a
partir de 16 de março. A propaganda do produto não diz nada sobre
tratamento do câncer, apesar de ser este o grande apelo comercial da
fosfoetanolamina no Brasil. Nem poderia, pois neste caso teria de se enquadrar
na regulamentação de medicamentos da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), e não há até agora nenhuma comprovação científica de que a substância
funcione, de fato, no combate ao câncer.
O site criado pela empresa Quality
Medical Line para comercializar o produto diz que a fosfoetanolamina atua como
“um poderoso bio imunomodulador que age de forma constante e preventiva a
distúrbios metabólicos e celulares, mantendo o equilíbrio e o bom funcionamento
do sistema imune e da saúde humana”. Um dos anúncios colocados pela empresa no
Facebook, porém, mostra uma mulher careca com a frase “Não desista!” – uma
imagem que remete ao câncer.
Fórmula idêntica
Em entrevista ao jornal Estado
de S. Paulo, Almeida disse que a substância que está sendo produzida na
Flórida é “idêntica” à que era produzida em São Carlos, porém sintetizada por
um método diferente, para o qual eles estão solicitando uma patente nos Estados
Unidos. “O que muda é o rendimento da síntese e a pureza do sal”, detalhou.
Além da fosfoetanolamina, o suplemento contêm cálcio, zinco e magnésio.
Almeida diz que se afastou de
Chierice porque ele era veementemente contra a venda da substância na forma de
suplemento alimentar, preferindo esperar a conclusão dos testes clínicos – que
estão sendo realizados em São Paulo -, para então comercializá-la como
medicamento.
Almeida e Meneguelo também
disseram não concordar com a posição de Chierice sobre os efeitos terapêuticos
da molécula, quando ele dizia que a fosfoetanolamina pode curar qualquer tipo
de câncer. “A gente não está buscando cura, estamos buscando melhorar a
qualidade de vida de pacientes terminais”, disse Meneguelo. “Nunca falei para
ninguém parar com radioterapia ou quimioterapia.”
A ideia de que a fosfoetanolamina
pode curar o câncer, segundo Almeida, “é até o momento uma hipótese não
confirmada”, que precisa ser validada pelos ensaios clínicos em andamento.
Custo
O custo previsto é de R$ 3,80 por
cápsula, e Almeida e Meneguelo deverão receber 2,5% disso na forma de
royalties. A produção inicial será de 500 mil cápsulas. A produção será feita
pela empresa Florida Supplement e distribuída pela Quality Medical Line, via
contrato com um laboratório uruguaio chamado Federico Diaz, com o qual a dupla
brasileira estabeleceu uma parceria.
Segundo Meneguelo, haveria a
possibilidade de produzir a substância como suplemento aqui mesmo no Brasil,
mas levaria pelo menos dois anos para cumprir todas as exigências da Anvisa.
“Prefiro receber críticas do que ficar assinando atestados de óbito”, disse.
Almeida disse que a fosfoetanolamina já é comercializada como suplemento nos
EUA há muitos anos, e que o registro do produto nos Estados Unidos seguiu todos
os trâmites legais.
Há críticas à iniciativa dos empreendedores:
alguns afirmam que o método de síntese não é igual ao empregado por Chierice, o
que poderia interferir nos resultados — o que não dá afirmar com certeza, já
que os testes independentes feitos até agora não apontam nenhum benefício bem
documentado da molécula.
Histórico
A produção e comercialização da
fosfoetanolamina sintética como droga anticâncer chegou a ser autorizada no
Brasil, em abril de 2016, por um projeto de lei aprovado no Congresso e
sancionado pela então presidente Dilma Rousseff, sob forte pressão política e
popular. Mas a lei foi suspensa no mês seguinte por uma decisão do Superior
Tribunal Federal (STF), por falta de evidências científicas da sua eficácia.
Estudos realizados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação indicam
que a fosfo não é tóxica, mas não encontraram nenhum efeito antitumoral na
substância.
(Com Estadão Conteúdo)
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