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Coutinho
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Não é o único caso controverso.
Sobram dúvidas sobre os critérios das escolhas feitas pelo STF. Por que o
tribunal demorou cinco meses para analisar o pedido de afastamento do deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ)?
O ministro Gilmar Mendes poderia ter segurado por 20 meses o
processo sobre o fim do financiamento empresarial de campanha após pedir vista?
E um dos processos contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL),
acusado de peculato e falsidade ideológica, que aguarda parecer dos ministros
há mais de três anos? Veja abaixo o que pensam especialistas sobre esses
problemas.
O timing da corte
Não existe nenhum critério
objetivo para determinar o que e quando será votado no STF. Thomaz Pereira,
professor de direito da Faculdade Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, explica que
“cabe ao presidente e seus pares julgar aquilo que entendem ser adequado, e
claro que há influencia de uma possível pressão social”. Neste cenário,
ministros podem dar maior ou menor importância a uma determinada questão, de acordo com seus critérios pessoais. “Quando você tem um
tribunal com muita liberdade para escolher o que e quando julga, ele passa a
ter o ônus de explicar suas decisões para a sociedade”, afirma Pereira. “É
preciso que a Corte diga a razão de um pedido de liminar ter sido julgado em
dias e um outro semelhante não ter sido analisado ainda anos depois de ter sido
protocolado”.
Uma justificativa frequentemente
evocada pelos ministros para a morosidade no andamento de alguns casos é o
grande volume de processos no tribunal. Pereira afirma que isso não pode ser um
argumento para a lentidão, e cita o caso da Suprema Corte dosEstados
Unidos como uma corte que tem critérios mais rígidos na seleção dos
casos. “Eles têm muito controle sobre o que julgam e o que não julgam, aceitam
poucos casos por ano”, diz o professor. Uma das consequências disso é que “tudo
o que admitem é julgado, a previsibilidade é muito grande, você sabe que o
processo será analisado no decorrer daquele ano judiciário”.
Em nota, a assessoria da Corte
informou que o regimento interno do STF "determina que os Habeas Corpus,
seguidos pelas causas criminais e as reclamações têm preferência na pauta de
julgamentos do plenário e das turmas", e que após estes casos "o
ministro Ricardo Lewandowski, durante a sua gestão, tem priorizado as questões
de repercussão geral, que são aquelas de relevância social, econômica, política
ou jurídica".
Sabemos que todos os Governos
desde a redemocratização negociaram essas nomeações [para o STF] com suas
respectivas bases políticas
Fiscalização da sociedade
Para o jurista Dalmo de Abreu
Dallari esse é um dos maiores problemas do STF. Atualmente a Constituição prevê
que o presidente indique um nome para ocupar a cadeira de um ministro que
aposenta, e cabe ao Legislativo sabatinar o escolhido. Neste ponto o Brasil se
inspirou no modelo de Corte Suprema dos Estados Unidos. “Isso acaba tendo
implicações políticas, sendo que o correto é que fosse uma escolha jurídica”,
avalia o advogado. Ele defende que “a comunidade jurídica fosse ouvida", e
que "elaborasse via voto uma lista tríplice, da qual o Executivo
escolheria um nome”. Para Dallari, isso “acabaria com aquele estigma de ‘fulano
é ministro da Dilma Rousseff’, ‘fulano é ministro do Fernando
Henrique Cardoso”.
Marcelo Cattoni, professor de
Direito Constitucional da Universidade Federal de Minas Gerais, aponta outro
problema crítico neste modelo de escolha de ministros. “Sabemos que todos os
Governos desde a redemocratização, negociaram essas nomeações [para o STF] com
suas respectivas bases políticas”, afirma. De acordo com ele, a consequência
disso é que a muitas indicações acabam sendo feitas para atender interesses
imediatos com relação à composição de base parlamentar, “algo típico do nosso
presidencialismo de coalizão”. Logo “nem sempre as nomeações recaem sobre
grandes especialistas”.
Para Cattoni, caberia à sociedade
fiscalizar esse fenômeno para impedir que aconteça, e “o Senado precisa
sabatinar de forma séria os indicados”. O professor cita a sabatina do ministroÉdson
Fachin em maio de 2015 como uma exceção: o procedimento durou sete
horas, e foi marcado por duros questionamentos.
Em alguns casos uma série de
medidas liminares são tomadas por um ministro, ou são concedidas ou negadas
liminares monocraticamente, e isso não é encaminhado para o plenário
O professor Fabrício Juliano
Mendes, do Centro Universitário de Brasília, discorda dos colegas. Para ele, o
fato da indicação ser feita pelo Executivo não é garantia de que o juiz seja
alinhado com a presidência. “Ao tomar posse no Supremo os ministros gozam de
vitaliciedade no cargo, o que permite que ele exerça a magistratura de acordo
com seu livre pensar. Nada o obriga a rezar a cartilha de quem o indicou”,
afirma. Além disso, Mendes cita a sabatina como um processo que confere
legitimidade ao processo, uma vez que os senadores são eleitos pelo povo e tem
a prerrogativa de não aprovar determinada indicação.
O ministro Luís Roberto Barroso,
por exemplo, já defendeu publicamente o atual modelo de indicação, e disse que
a politização das indicações pelo Executivo pode acontecer em teoria, “mas a
verdade é que no mundo real não acontece”. Existe na Câmara Federal uma
Proposta de Emenda à Constituição que a alternância nas indicações entre o
presidente da República e o Congresso Nacional na escolha dos ministros.
Decisão monocrática e poder do
relator
Outro ponto questionado pelos
especialistas é o grande número de decisões monocráticas[tomadas por apenas
um ministro] proferidas na Corte. “Em casos excepcionais a decisão monocrática
é necessária, pois trata de assuntos urgentes, e remeter a questão à turma ou
ao plenário leva tempo, estudos e pareceres”, afirma Dallari, que defende seu
uso restrito a casos especiais nos quais o tempo é realmente um fator chave –
como processos que envolvem prisões, por exemplo.
Se constrói uma cultura entre o
Ministério Público, juízes e advogados, na qual ninguém cobra ninguém
Cattoni afirma que reformas
processuais pelas quais os tribunais brasileiros passaram desde os anos de 1990
atribuíram muito poder aos juízes relatores – que são responsáveis por
determinados casos. “Eles podem tomar uma série de decisões monocráticas, que
depois precisariam ser referendadas pelo plenário”, diz o professor. Caberia ao
relator pedir para que essa decisão “seja incluída na pauta, o que muitas vezes
não é feito”. “Em alguns casos liminares são concedidas ou negadas
monocraticamente, e isso não é encaminhado para o plenário”, afirma.
Pedido de vista sem prazo para
devolver
O regimento interno do Supremo
estabelece prazos para que um ministro possa analisar um processo após pedir vista. “O problema é
que eles não são cumpridos”, diz Cattoni. “Qualquer advogado nesse país dirá
informalmente: prazo existe para as partes, dificilmente para os juízes”. De
acordo com ele, “há quem diga que as partes não cobram os prazos por medo de se
indispor com os juízes em uma instância na qual isso pode ser desastroso, já
que não se pode recorrer a nenhuma corte superior”, afirma. Nestes casos, “se
constrói uma cultura entre o Ministério Público, juízes e advogados, na qual
ninguém cobra ninguém”.
Pereira, da FGV, afirma que esse
problema poderia ser resolvido com o cumprimento do regimento - 20 dias para
cada pedido de vista -, e a devolução imediata do processo após o término do
prazo. "Em um sistema como o nosso, em que os ministros estão entre iguais
e não há ninguém para obrigá-los a cumprir as normas, é preciso que eles
assumam responsabilidades individuais para cumprir os prazos do
regimento". De acordo com projeto Supremo em Números, da FGV-Rio, só 20%
dos processos são devolvidos no prazo.
Dalmo afirma que “é normal que em
casos mais complexos o julgador queira algum tempo extra para fazer exame
pormenorizado do processo”, mas que o que se vê no STF é a “haja possibilidade
de engavetamento de processos por meses”. Para o jurista, o regimento interno
da Corte é vago quanto aos prazos, por isso haveria a necessidade de que fossem
“fixadas normas regimentais mais rígidas”.
Em nota, a assessoria do tribunal
afirmou que "não ocorrendo a devolução após o período, o presidente do
Tribunal ou das Turmas comunicará o ministro sobre o vencimento do prazo".
Antecipação de voto antes ou
durante um processo
“Acho a antecipação do voto
maléfica. Deve ser sempre lembrada uma frase que é: ‘juiz só fala nos autos”,
diz Dallari, que ressalta, no entanto, que isso é cada vez mais comum por parte
de alguns ministros. “Juiz dando entrevista, participando de reunião com
políticos, isso é altamente prejudicial para a preservação da independência do
Judiciário e de sua imagem, é uma prática negativa”, afirma. O jurista
acredita, no entanto, que essa deve ser “uma questão ética, não pode ser
regimental, senão há um cerceamento do direito do juiz. Ele precisa tomar
consciência de seus deveres”.
Cattoni afirma que a lei orgânica
da magistratura proíbe que o juiz antecipe seu voto, por entender que isso
seria “uma violação do dever funcional”. “Mas isso não é punido”, diz o
professor. Qualquer uma das partes que se sentir atingida pelas declarações de
um juiz pode pedir a suspeição ou impedimento do magistrado – que poderia
implicar no seu afastamento de determinado caso. “Um dos casos de suspeição
previsto na legislação é aquele em que o juiz se apresenta publicamente como
inimigo declarado de alguma das partes”, explica. Mas novamente aqui a questão
esbarra em um desejo de advogados e do MP de não se indispor com os magistrados.
Em nota, a assessoria do Supremo
afirmou que é vedado aos juízes “manifestar, por qualquer meio de comunicação,
opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo
depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais,
ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do
magistério”. De acordo com o texto, a responsabilização dos ministros do STF,
"no caso de infrações de natureza político-administrativa, compete ao
Senado Federal".
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