Ocorrido em 1983, o caso de violência contra a farmacêutica bioquímica ganhou repercussão e, apesar da morosidade da Justiça, resultou na principal ferramenta jurídica de defesa das mulheres vítimas de violência.
Símbolo maior da luta de combate à violência contra
a mulher, a farmacêutica bioquímica Maria da Penha, cuja história de vida
inspirou a lei que leva seu nome, queixa-se também da ineficiência, da
morosidade e da falta de preparo dos profissionais da magistratura brasileira.
Segundo ela, faltam políticas públicas, delegacias da mulher, centros de
referência e, também, sensibilidade e capacitação dos profissionais ligados ao
Judiciário para lidar com casos, como o vivido por ela. Maria da Penha foi a
entrevistada do Programa 3 a 1, exibido na noite da última quarta-feira (18) na TV
Brasil.
Ocorrido em 1983, o caso de violência contra a
farmacêutica bioquímica ganhou repercussão e, apesar da morosidade da Justiça,
resultou na principal ferramenta jurídica de defesa das mulheres vítimas de
violência. Penha admite que a lei, sozinha, no papel não funciona. “Falta criar
políticas públicas, [e investimentos em] delegacias da mulher, centros de
referências da mulher, casa abrigo e juizado”, disse Maria da Penha. “Mas não
adianta ter a política pública se quem está trabalhando não for sensível e não
for capacitado”, acrescentou.
A lentidão do Judiciário foi muito criticada por
Maria da Penha. “Eu vi a demora do Poder Judiciário deixando o processo dentro
das gavetas e atendendo recursos procrastinadores [impetrados com o objetivo de
atrasar o processo]”. Penha lembrou que no primeiro julgamento o marido foi
condenado a uma pena de oito anos, mas acabou livre por causa de recursos.
“Nesse momento, eu fiquei muito angustiada. Já era
uma conduta do Judiciário garantir a impunidade dos agressores na época”,
disse, ao lembrar dos efeitos que a situação causava em sua família.
“Precisamos criar nossos filhos em um ambiente saudável, um ambiente sem
violência”. “E não adianta ter a política pública se quem está trabalhando não
for sensível e não for capacitado. Mudar a cultura é difícil. Tem de haver um
olhar público para quem tem a responsabilidade de aplicar e de dar agilidade
aos processos”.
Penha considera a divulgação de casos como o dela
muito importante. “[Por isso] vou escrever um livro e contar minha história”,
anunciou durante o programa. “O livro vai mostrar que o Poder Judiciário não
faz justiça e que as políticas públicas que devem ser criadas para atender a
lei não existem. [E mostrar que] gestor público não se sensibiliza [em casos
que envolvem a violência contra mulheres]”, revelou Maria da Penha no programa.
Ela espera que, com o livro que publicará contando seu caso, as pessoas se
conscientizem sobre a importância de fortalecer as políticas públicas que
combatam a violência contra a mulher.
Em diversos momentos do programa, Maria da Penha
lembrou dos momentos em que foi vítima da violência do ex-marido, que chegou a
simular um assalto para esconder da Justiça a agressão que praticara contra
ela.
“Numa madrugada eu acordei com um forte estampido
dentro do quarto, quis me mexer e não consegui. Pensei: o Marco me matou”.
Maria da Penha ficou internada por quatro meses, ainda confusa sobre o que
havia ocorrido exatamente, até tomar conhecimento de que o ex-marido havia
contado uma versão mentirosa às autoridades, de que o tiro havia sido disparado
por um dos assaltantes que entraram na casa. Em outra ocasião, lembrou a
farmacêutica, ele tentou eletrocutá-la, danificando o chuveiro elétrico. Na
época, as filhas do casal tinham 7, 4 e 2 anos de idade.
Durante a gravação do programa, ela falou da
relação entre as filhas e o pai e que, para manter a família, perdoava
“grosserias” e “condutas” do marido. Ela contou que o ex-marido agredia as
crianças com frequência e, que, diante disso, as meninas encararam bem a
separação e o fato de a mãe ter denunciado o pai. “Conversei com ele várias
vezes sobre nos separarmos. Mas eu não tinha coragem de enfrentar uma separação
sem ele querer, pelo medo que eu tinha dele”. Foram necessários quase 20 anos
para que o ex-marido fosse condenado pelo crime que cometeu. Ele ficou preso
por dez anos e hoje está livre.
Fonte: Agência Brasil
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