Substâncias
no sistema digestivo dos insetos podem ajudar a criar álcool.
Resultados obtidos são promissores, afirma professor da UFRJ.
Um grupo de
pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) está estudando
como usar baratas - mais precisamente enzimas especializadas no sistema
digestivo delas - para ajudar na obtenção do etanol.
A ideia é
usar as enzimas para degradar bagaço de cana e com isso obter açúcares, que
podem ser usados para produzir etanol, aponta o professor Ednildo de Alcântara
Machado, do Instituto de Biofísica da UFRJ. O álcool é obtido pela fermentação
destes açúcares, realizada por fungos conhecidos como leveduras.
Dois tipos
de baratas estão sendo pesquisados: a Periplaneta americana, espécie comum
e encontrada em esgotos e escondidas nas casas; e a Nauphoeta cinerea, um
tipo de barata da América Central, mas que hoje é encontrada em vários lugares
do globo. Alimentados com bagaço de cana, os insetos se adaptaram e tornaram-se
capazes de digeri-lo, produzindo enzimas especializadas para isso, diz o
pesquisador.
"Os
resultados são bastante promissores. Essa adaptação que o inseto faz ao bagaço
tem sinalizado que dele podem vir novas fontes de enzimas", afirma
Machado. As baratas foram capazes de sobreviver por mais de 30 dias somente com
o bagaço de cana, ressalta o cientista.
Ele afirma
que a pesquisa, por enquanto, encontra-se nas etapas de condicionar as baratas
para consumir o bagaço e de identificação das enzimas especializadas. O etanol
ainda não foi obtido. "Não é uma coisa distante [a produção do
etanol]", diz Machado, "mas as etapas têm que ser trabalhadas em conjunto. Não sei
dizer quando [vai ser produzido]".
Fáceis de
criar
O grupo de
pesquisadores também estuda a degradação da biomassa usando cupins, o que
ocorre com relativo sucesso, segundo Machado. "Mas as baratas são mais
fáceis de criar em
laboratório. Elas se adaptam com facilidade", afirma.
Ele ressalta que os dois insetos têm fisiologia parecida.
A ideia
para o futuro é isolar as enzimas produzidas pelas baratas e tentar criar um
"kit enzimático" que permita retirar o açúcar do bagaço da cana em
laboratório, diz Machado. "Um dos desafios é o custo, a produção destas
enzimas em escala industrial ainda é muito cara. O nosso modelo tem apelo
porque é uma fonte nova de enzimas, pode ajudar a ter enzimas mais
eficientes", diz ele.
Novas etapas
Pesquisar
as enzimas é uma etapa importante para produzir o etanol, mas não é a única,
diz o pesquisador. Outros pontos importantes são o tratamento do bagaço da
cana, para que ele seja facilmente degradado, e a fermentação. O próximo
desafio do grupo, de acordo com Machado, é aumentar a escala de produção das
enzimas. "Se elas continuarem com a eficiência [encontrada], acredito que
podem ajudar."
As baratas
"moldam" sua digestão a outras fontes de biomassa, como restos de
papel, diz o cientista. "O que parece ser interessante é que quando você
muda a biomassa usada como comida, ela se adapta. Em dez dias, em média, ela
começa a produzir uma série de enzimas especializadas para quebrar o
alimento", afirma. Diante da mudança de fonte de comida, a barata adapta
também a sua microbiota, a "fauna" de micróbios que vivem em seu
sistema digestivo, relata Machado. "São microorganismos de alto interesse
tecnológico, eles produzem uma série de enzimas."
Manipulação
genética
Algumas enzimas do sistema digestivo da barata já foram identificadas, segundo o pesquisador. Um dos próximos passos é estudar como retirar partes do DNA dos insetos que definem a produção destas substâncias, para inseri-los em bactérias por manipulação genética.
Os
micróbios "transgênicos" poderiam então produzir as enzimas e
degradar a biomassa em escala industrial. O pesquisador aponta um ganho
ambiental com a produção do etanol desta maneira: a diminuição da necessidade
de se plantar cana-de-açúcar. "Em vez de plantar mais cana, você
aproveitaria o corpo das células da planta. Você aumentaria a produção do
álcool sem plantar mais", diz Machado.
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