segunda-feira, outubro 03, 2016

De divórcios a assassinatos: China passa a transmitir julgamentos ao vivo na internet

China passou a transmitir ao vivo pela internet uma série de
 julgamentos (Foto: China People's Court/ Reprodução/ BBC)
Em um país criticado pela falta de transparência, medida gera elogios, mas também questionamentos por expor privacidade dos réus.
Tentando injetar transparência em seu criticado sistema judiciário, a China passou a transmitir ao vivo pela internet uma série de julgamentos, que vão de divórcios a casos de assassinatos.
As sessões estão sendo transmitidas através do website tingshen.court.gov.cn. Algumas podem ser acessadas ao vivo via streaming, enquanto outras são gravadas.
O usuário que entra no site pode mover o cursor de seu mouse pelo mapa da China para selecionar a província onde os julgamentos estão acontecendo. Ao lado, há uma barra de rolagem com vários tribunais e o número de audiências já transmitidas em cada um deles.
Ao escolher um deles, o usuário tem uma visão geral de cada uma das sessões: a perspectiva da defesa, juízes e advogados. Em alguns casos, os julgamentos podem ser assistidos novamente mesmo depois de terem terminado.
Abertura controlada
Um julgamento na China não pode oficialmente ser descrito como "fechado", mas isso não significa que qualquer um possa entrar e acompanhar.
Cada tribunal tem um sistema diferente para decidir quem está ou não autorizado a entrar. Em algumas ocasiões, até os membros da família são proibidos de acompanhar as audiências.
Em um país onde um jornalista em busca de informação se sente como dando murro em ponta de faca, esse novo dispositivo aparenta ser sofisticado, além de aberto.
Mas isso não significa que todos os julgamentos vão ser transmitidos. Alguns casos políticos e polêmicos permanecerão em segredo.
Para o presidente da Suprema Corte Popular da China, Zhou Qiang, o site de transmissões ao vivo "garante o direito das pessoas de ter acesso às informações e supervisionar".
Segundo ele, pode também ajudar os chineses a se informar melhor sobre o que está acontecendo no país, contornando o filtro imposto pela mídia, que é controlada pelo Estado.
Zhou acredita que as transmissões podem ajudar na compreensão de como opera o sistema legal da China - e que não deve demorar para que os observadores mais entusiastas percebam que os réus quase sempre perdem os casos no país.
Questão de privacidade
A advogada Lu Miaoqin já trabalhou em casos importantes, incluindo o de uma mulher que foi demitida por ser lésbica. Para ela, o streaming é bem vindo porque "faz com que os advogados sejam mais profissionais".
Mas outros são mais cautelosos. "Eu não acho apropriado transmitir julgamentos porque muitas das pessoas envolvidas nesses casos provavelmente não querem dividir suas informações pessoais com o público", disse à BBC o advogado de direitos humanos Liang Xiaojun.
Já o advogado Zhang Yangfeng consegue ver o lado positivo e negativo da iniciativa. "Isso é uma forma de garantir que a Justiça não seja corrupta e pode prevenir a manipulação de julgamentos", disse.
"Por outro lado, pode usurpar a privacidade das pessoas. Para aqueles jovens que cometem crimes pequenos, seus erros são normalmente perdoados e esquecidos, mas agora eles se tornam públicos."
Há diferenças no uso dessa ferramenta de província para província. Jiangsu, por exemplo, um local próspero na costa leste ao norte de Xangai, ou Guangdong, perto de Hong Kong, são pioneiras nessa iniciativa. Já o Tibete, Xinjiang e outras áreas mais remotas ainda não transmitem para o site.
Em um país onde o segredo parece ser a regra, e a falta de acesso a informações, um modo de vida, o site pode ser considerado um passo em uma outra direção.

A maioria dos observadores avalia que, sob a liderança do presidente Xi Jinping, a China se tornou mais linha dura. As prisões de advogados de direitos humanos e outros ativistas em tempos recentes são argumentos que reforçam essa tese. Nesse contexto, o site nada contra a correnteza.

BBC News ,Beijing

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